MINHAS CRÔNICAS

sábado, 10 de outubro de 2009

Professor Bittencourt, por que o senhor fez isto comigo?


A dor que sinto é tão grande! A falta que o meu amigo, Professor Bittencourt, me fará, não consigo, ainda, aquilatar.
Teilhard de Chardin, famoso padre jesuíta francês, no dia 18 de março de 1934 escreve a um amigo, diretamente de Pequim (Lettres de Voyage-1923-1955, Paris), dando noticia do falecimento do poeta Davidson Black, a quem ele, Chardin, devotava imensa amizade e devoção:
“Escrevo-lhe para dar-lhe maiores detalhes sobre uma tragédia: Davidson Black morreu subitamente, ontem à noite de parada cardíaca. Seu coração estava em mau estado já há algum tempo. Há cinco semanas tivemos um alerta; mas esperava-se uma melhora. Porém, o desenlace se precipitou. Black se sentia melhor na aparência. Ele estava falando com veemência com alguns amigos, sempre cheio de projetos. Alguns minutos mais tarde morreu. Foi uma bela morte, repleta de élan. Mas uma vazio terrível...mas que coisa absurda, aparentemente, é a vida...tão absurda que se sente rejeitado por uma fé perseverante e desesperada. É com Black que eu pensava, que eu amava e que eu planejava meu trabalho. No desespero que sobreveio após a morte de Black, dentro da estonteante atmosfera que envolvia sua morte, eu jurei, diante do corpo do meu amigo, lutar, mais do que nunca, para dar uma esperança ao trabalho”.
Na sexta-feira, 26 de setembro, logo no começo da tarde, recebi do professor Bittencourt o seu, quase diário e.mail:
“Minha cordial saudação; sinto falta da nossa habitual correspondência virtual. Nos últimos dias não tenho me sentido bem e preciso saber o que está acontecendo comigo; hoje à tarde vou ao encontro do meu médico. Aguardamos seu regresso!”
Nesta mesma tarde o Professor Bittencourt morria!
Qual a semelhança entre estes dois episódios? Em ambos houve a crueldade do acontecimento inesperado!
Choro a morte do amigo querido que partiu; não o perdemos porque fica a sua imortal idéia; sabemos, como ele sempre repetia, que os desígnios do Criador foram estabelecidos com muita antecedência, porém, cometendo um deslize com a fé, preciso repetir um trecho dos Sermões de Vieira:
“Por que não terão também os anos o que tem o ano? O ano tem tempo para as flores e tempo para os frutos. Por que não terá também o seu outono a vida?”
O senhor não tinha o direito de partir agora Professor Bittencourt; nesta viagem que fiz, cumpri o que lhe prometi: estive na cidade onde John Steinbeck morou por muitos anos, bisbilhotei os lugares por onde ele andou, comprei livros antigos que ele escreveu, fiz fotografar-me junto ao seu busto.
Para quem vou narrar estes acontecimentos agora? Para quem vou enviar a fotografia? Com quem, daqui para frente, na calada da noite, somente com a companhia do meu computador, irei discutir assuntos tão ecléticos como fazíamos?
Ao ouvi-lo falar com tanta fé sobre a religião católica aprendi, com o senhor, que ter fé não pressupõe acumulo de cultura, mas sim o necessário engajamento que opera além da razão, ou até mesmo contra a própria razão.
O senhor vinha sendo a alma fiducial que precisava, e agora? Com quem vou continuar a discutir o assunto que interrompemos acerca da maravilhosa correspondência que o pensador católico Alceu de Amoroso Lima mantinha com a sua filha, a madre Maria Tereza?
Ainda agora vejo, postada em lugar privilegiado da minha estante, vigiando minhas ações e meus pensamentos, a protetora de nós ambos, Santa Terezinha do Menino Jesus.
Ela, tenho certeza, está lhe protegendo neste novo mundo de luminosidade; continuarei minha caminhada, trombando com as minhas lembranças, com saudade de tudo que vai ficando para trás; com saudade do senhor!
Minha alma, neste momento de tanta emoção, sofre a tentação do pecado da inveja; minha alma sente inveja daqueles que possuem a capacidade de saber retratar com as palavras que, debalde as procuro e não as encontro. Retratar o sentimento de paixão que emana do meu espírito.
Peço ao meu amigo Goethe para ajudar-me:
“Os últimos companheiros de uma longa jornada têm mais coisas a dizer um ao outro”
Meu relacionamento afetivo com o Prof. Bittencourt é de recente era, aproximamos nas reuniões culturais da Academia Goiana de Letras, embora, como não poderia deixar de ser, acompanhava-o, à distância, há muito tempo. Sua crônica semanal no Diário da Manhã, que lia com assiduidade e, principalmente, com muito prazer, era a diretriz das minhas movimentações no mundo das letras.
A partir daquele encontro, deixamos que a empatia mediasse o nascimento de uma grande amizade que se tornou extensiva à sua digna família, mormente a sua querida esposa, senhora Veneranda.
Descanse em paz meu amigo Professor Bittencourt!

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