MINHAS CRÔNICAS

terça-feira, 29 de dezembro de 2009

DEIXE-ME CONTAR ENQUANTO ME LEMBRO!

A MARAVILHOSA LUA DO TOCANTINS
Dedicado ao confrade Mario Ribeiro Martins

Chegamos, José Paulo e eu, à fazenda São Pedro, localizada no alto da serra do Taquaralto, mais ou menos às oito horas da noite. A lua, a maravilhosa lua do Tocantins, iluminava nossa estrada como se fosse um imenso holofote sustentado na imensidão do firmamento pelas mãos do Grande Arquiteto do Universo.
Havia uma aura positiva naquela viagem, estávamos comemorando cinco anos de aquisição daquelas terras; quantos sonhos foram depositados naquele empreendimento, quantas dificuldades foram vencidas pela força da juventude; ao chegarmos ali em 1985, não tínhamos idéia do trabalho que nos aguardava: transformar trezentos e cinqüenta alqueires de capoeira em uma fazenda.
Não adianta tentar descrever o nosso sentimento de júbilo, somente os que viveram desafios semelhantes poderão aquilatar a nossa sensação de vitória; enfrentamos dificuldades inacreditáveis, principalmente pelo isolamento (o vizinho mais próximo estava a mais de 50 quilômetros de distância), perigos com animais peçonhentos, animais selvagens ( vimos onça cruzando nossa picada a algumas dezenas de metros à frente), enfim, o homem só contava com o homem que estivesse próximo de si.
Recapitulava estes acontecimentos enquanto nossa camionete caminhava pela estrada que construímos dentro dos limites da fazenda, apertei a mão do José Paulo e transmitimos, um ao outro, o sentimento de fraternidade familiar e, principalmente, de companheirismo, pois ele foi um dos meus mais assíduos parceiros nesta aventura.
Sentimos emoção naquele aperto de mão, sempre iremos lembrar!
As noites aqui na Fazenda são agradáveis e tranquilas, praticamente nenhum ruído, a luz é artificial (lamparina, velas e lampião a gás) o que torna o ambiente diferente de tudo a que estamos acostumados.
Sentamos em alguns tamboretes na varanda, rodeados pelo nosso funcionário “Zé tratorista” e sua esposa Rosealindes; José Paulo, como sempre, dava provas de como se prepara um bom churrasco de picanha; enquanto aguardávamos que a carne chegasse no “ponto”, o papo corria solto, sobre uma variada gama de assuntos.
O whisky com gelo, desce redondinho e com suavidade, o churrasqueiro exige uma dose em troca de uma rodada de carne, “Zé tratorista” e Rosealindes contam suas “estórias”, algumas incríveis, outras aceitas como verossímeis com certa dificuldade.
- Certa vez, ficamos nós dois (a Rosealindes grávida) durante seis dias parados na estrada, devido a um defeito na camionete, não passando nem uma viva alma para socorrer-nos durante todo este tempo; ainda bem que eu estava armado, comemos até macacos.
- Certa vez, tive que andar cinco quilômetros de marcha ré, porque a marcha “encavalou” bem no meio de uma “estrada de areal” e se eu “apagasse” a camionete não tinha como dar partida, pois o motor de arranque estava estragado e a Rosealindes não daria conta de empurrá-la, ficamos, com os pescoços duros durante uma semana de tanto olhar para trás.
Muitas e muitas outras estórias são narradas, todas com a confirmação da Rosealindes , sempre seguidas de gargalhadas e mais gargalhadas.
No entanto a mais incrível da noite é o caso do trator em que entrou ar na distribuição e apagou no meio do cerrado, longe da casa.
“Zé tratorista” veio buscar Rosealindes para ajudá-lo; foram de jeep e levaram, junto com eles, uma menina, irmã da Rosealindes.
Amarrou-se um cabo de aço entre o trator e o jeep e o “Zé tratorista” deu todas as instruções possíveis para a esposa e para a menina:
- Quando alcançar uma certa velocidade, você solta este pé daqui do pedal e depois de andar um pouco, torna a pisar no mesmo pedal e vai pisando devagar neste outro pedal do freio para o trator parar, porém, funcionando.
- A menina vai com você para te ajudar a lembrar, tá bom ?
Não chore bem, se você ficar nervosa é pior, e eu não tenho outra opção a não ser você, num raio de mais de 50 quilômetros.
Tudo entendido, “Zé tratorista” entra no jeep, Rosealindes e a menina no trator e lá vão para o encontro com o destino.
- Quando eu levantar o meu braço, você solta o pé esquerdo e depois faça o resto que te orientei, ta bom?
O tranco foi perfeito, o trator “pegou” de primeira, porém, o Zé não avaliou bem o estado emocional da esposa, pela primeira vez sentada ao volante de um possante trator Ford, ela que nunca havia, ao menos, dirigido um velocípede.
Era muita emoção acumulada, a partir do tranco, Rosealindes não se lembrava de nenhuma outra instrução recebida, muito menos a menina, que ao ver o choro da irmã, não só passou a chorar como a gritar.
O Zé diminuía um pouco a velocidade do jeep para ver se ela estava seguindo as instruções, mas observava que o trator se aproximava de maneira muito perigosa da sua traseira; gritar para dar instruções não adiantava pelo próprio barulho do motor do trator, o desespero era evidente, rodava para todos os cantos do pasto e o trator atrás, o suplício parecia não ter fim.
Depois de passar pela sua cabeça todas as soluções possíveis, levou uma “chicotada” no pescoço que só não fraturou porque não era o dia; a Rosealindes havia dado uma freada violenta no trator, tão violenta que rebentou o cabo de aço que ligava as duas viaturas.
Completamente atordoado pelo choque, o Zé ainda acumulou forças para manobrar o jeep e correr até o trator e assumir o volante.
Hoje Rosealindes virou tratorista de mão cheia!

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