MINHAS CRÔNICAS

terça-feira, 1 de junho de 2010

LONDRES, o passado repercute no presente!

Em maio de 1972 fui a Londres pela primeira vez, iria cumprir um estágio no Hospital São Marcos, naquela época a Meca do ensino em Coloproctologia no mundo.
Marília e eu, ainda muito jovens, viajamos com nossos corações nas mãos, deixamos nossos filhos ainda muito pequenos aos cuidados dos nossos parentes e fomos enfrentar o desafio que nos impusemos; Ana Paula, a nossa caçula, tinha apenas alguns meses de vida.
Lembro que discutíamos e sofríamos, Marília e eu, sobre a nossa “irresponsabilidade” em deixá-los tão novos, por um período tão prolongado de tempo (seis meses); nossa união e a confiança no futuro nos empurraram rumo ao nosso destino; para se ter uma idéia da idade das crianças, Ana Paula, ao voltarmos, “estranhava-se” conosco, recusando aceitar nosso colo, resultado: Marília chorava de um lado e Ana do outro!
Na tentativa de animar-nos e convencer os parentes sobre o acerto do nosso gesto, gostava de repetir, como consolo para nós mesmos:
- As crianças terão a vida toda pela frente e nós, se não aproveitarmos agora, deixaremos passar a oportunidade das nossas vidas!
Lembro-me como se fosse hoje, chegamos a Londres no mês de maio, mês em que o frio começava a mostrar sua onipresença; uma garoa fria congelava nossas faces e dificultava, inclusive, a deambulação.
Tínhamos o endereço da Casa do Brasil (Lancaster Gate, 49) nas imediações do Hyde Park; tomamos um taxi no aeroporto Heathrow e fomos temerosos, à procura de guarida e, se não houvesse a vaga prometida, pelo menos alguma indicação de um hotel barato nas suas imediações, enquanto aguardaríamos ser chamados.
Felizmente, dois ou três dias depois, conseguimos nos alojar naquela maravilhosa casa mantida pelo governo brasileiro, onde as acomodações eram satisfatórias, com direito a uma refeição ao dia e com preços bem razoáveis; nosso dinheiro, resultado da venda que fizera de um carro, dinheiro das férias na faculdade e algumas economias que vínhamos fazendo já há algum tempo, era regrado.
Jamais iremos esquecer a Casa do Brasil, todas as vezes que voltamos a Londres fomos visitá-la e rever o seu Diretor, Sr. João Lourenço e sua família; infelizmente o tempo passou e um dia o Sr. João morreu e sua família voltou para o Rio de Janeiro; algum tempo depois a casa foi fechada (economia de divisas!).
Moravam ali cerca de 30 brasileiros, todos eles estudantes de algum curso nas universidades de Londres, havia um espírito de grande camaradagem entre o grupo, provavelmente devido, em parte, à saudade que todos sentiam do Brasil.
Alguns meses depois da nossa chegada, o casal de amigos Dr. Heitor Rosa e Consuelo foram para Londres, como nós, a procura de estágio em medicina e graças ao nosso relacionamento com a direção da casa, conseguimos vaga para os dois; foi a melhor coisa que poderia ter acontecido, Marília e Consuelo faziam companhia uma a outra e Heitor e eu, divertíamos nos finais de semana a procura de programas gratuitos para os casais (Museus, galeria de artes, parques, jardins, etc.).
O escritor, sempre que pode, costuma mesclar nas suas narrativas ficcionais alguns fatos reais do seu cotidiano, foi o que fiz ao escrever alguns episódios da vida de Couto de Magalhães (Couto de Magalhães, o Último desbravador do Império – Ed. Kelps, Goiânia, 2005).
Os leitores que me deram a honra de ler meu livro devem se lembrar do episódio da chegada de Couto Magalhães em Londres; para os que não o leram, peço permissão para transcrever alguns trechos do mesmo:
“Em uma tarde de final de verão, início do outono europeu, segundo semestre do ano de 1876, o General José Vieira Couto de Magalhães desceu de um fiacre puxado por uma parelha de cavalos brancos. O local parecia que já lhe era conhecido, tantas foram as vezes que ele estudara o mapa de Londres, principalmente o daquelas imediações, perto do Hyde Park.
Voltou a consultar, em um pedaço de papel que conservara no bolso do paletó, o endereço que passaria, dali em diante, a procurar naquelas imediações; instintivamente tratou de ler o nome da placa sinalizadora da rua onde estava: Bayswater.
De acordo com as informações que recebera, ainda em São Paulo, a rua que deveria procurar estava localizada naquelas imediações; bastava, tão somente, seguir a Bayswater no sentido contrário de onde viera e ir contornando-a, seguindo o seu formato que imitava uma ferradura, até passar de frente a uma pequena igreja. Lateralmente à mesma se encontrava a Lancaster Gate; o número estaria bem visível no frontispício do pequeno edifício. Couto observou que todos os edifícios daquela rua e de todas as outras ruas da vizinhança eram praticamente iguais. O número 49 estava escrito com caracteres em branco, portanto bem visíveis, uma vez que a placa era toda azul esmaltada”.
Com podem ter observado, Couto de Magalhães “aportou na casa do Brasil”, onde morei em 1972.



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