MINHAS CRÔNICAS

quarta-feira, 11 de janeiro de 2012

NOTAS DE VIAGENS - Caminhar pelas ruas das metrópoles - Dedicado ao Prof. Joel Ulhoa, ex-Reitor da UFG

Entre as grandes e badaladas cidades do mundo Paris é, a meu ver, a mais convidativa e desafiante para o turista que deseja conhecê-la caminhando pelas suas ruas e avenidas; posso dizer com algum conhecimento de causa, pois costumo fazer isto em várias outras grandes cidades.

Certa feita, nos anos de 1970, em um tempo que ainda viajávamos embalados com as ilusões dos jovens, Marília e eu resolvemos seguir um dos roteiros definidos pelo guia Michelin; sentamos a uma mesa colocada na calçada de um bistrô localizado em um agradável e movimentado Boulevard, pedimos dois enormes sanduíches de pão com presunto e queijo, as tão famosas “baguettes”que são carregadas debaixo do braço pelos franceses, meia garrafa de champanha e passamos a discutir nossa programação.

Havia várias opções de roteiro, tais como: Conheça Paris a pé em uma semana, cinco dias, três dias, dois e um dia; é claro que cada uma destas opções acrescentava ou diminuía tais e tais pontos turísticos. Escolhemos o trajeto de três dias. Andamos praticamente o dia todo em todos os três dias! Valeu, podemos dizer que viramos Paris de cabeça para baixo.

Outras vezes voltamos a Paris e agora, com a sedimentação da cultura proporcionada pelos anos de vida, temos feito peregrinações selecionadas escolhendo, na maioria das vezes aqui em casa antes de viajar, os roteiros a serem feitos de acordo com nosso interesse cultural

Nestas caminhadas temos tido momentos de real emoção; uma delas, que sempre ficará inolvidável em nossas lembranças, é a que fizemos percorrendo a rua l’Odéon, local onde existia, desde 1919 até a época da ocupação nazista, quando foi fechada em 1941, a famosa livraria “Shakespeare and Company”, pertencente à norte-americana Sylvia Beach.

A rua L’Odeon está localizada perto do Jardim de Luxemburgo, na “Rive gauche”, a boêmia margem esquerda do rio Sena, região habitada pela chamada “geração perdida” das artes e da literatura, no período compreendido entre as duas guerras mundiais

Ao percorrermos aquela rua aparentemente tão modesta, procuramos contextualizar os acontecimentos literários ali ocorridos nos anos de 1920, 1930, quando uma efervescência de escritores, pintores e poetas por ali circulavam e se encontravam no recinto daquela outrora famosa livraria, destacando-se, dentre eles Hemingway, Scott Fitzgerald, Gertrude Stein, Salvador Dali, William Faulkner, Ezra Pound, André Gide, Paul Valéry, Joyce e muitos outros que viveram ali naquela época.

Recentemente li na revista cultural “Serrote” uma carta datada de 18 de junho de 1949 que o escritor, sobretudo cronista mineiro, Paulo Mendes Campos enviou de Paris para seu amigo Otto Lara Rezende.

Paulo contava na época 27 anos de idade e era a primeira vez que visitava Paris; dentre outros assuntos ele informa ao amigo que tem “andado a pé em demasia” para conhecer uma lista de preferências que havia elaborado, dentre elas uma visita ao túmulo de Baudelaire.

Se o individuo deseja, realmente, conhecer uma cidade com algum detalhe, acho que a melhor maneira de fazê-lo é caminhar, sem pressa, pelas suas ruas, parando, consultando suas anotações e sobretudo perguntando aos outros pedestres.

Existem, no entanto, algumas cidades nas quais é impossível caminhar pelas suas ruas, uma vez que os seus habitantes não possuem este costume; cito o que vivenciei em Dallas quando ali residi por seis meses; antes mesmo de ocupar o apartamento, que me fora reservado pela Universidade do Texas, aluguei um carro.

O escritor australiano John Baxter (The most beautiful walk in the world – A mais bela caminhada do mundo, 2011), conta de maneira divertida, sua experiência de vida nos Estados Unidos: “Morava na Veteran Avenue em Los Angeles, local quieto e cheio de prédios de apartamentos; sempre caminhava pelas calçadas que circundavam os prédios e nunca encontrei uma pessoa fazendo a mesma coisa, todo mundo usava o automóvel mesmo para percorrer distâncias insignificantes”

Este escritor conta uma cena que ele reproduziu de um livro de ficção científica, que já foi publicado no Brasil com o título “Uma sombra passou por aqui”, de autoria do escritor norte-americano Ray Bradbury - “Uma noite um “carro robot da policia” parou o personagem que caminhava pela rua e mantiveram o seguinte diálogo:

O que você está fazendo na rua? Perguntou o robot

Estou caminhando, somente caminhando

Caminhando para onde? Para que?

Caminhando para respirar. Caminhando para ver coisas.

A resposta o condenou, pois quem, a não ser um louco, poderia caminhar por prazer; foi encaminhado para um Centro Psiquiátrico de pesquisas em tendências regressivas”.

Quando escrevia este texto dei-me conta que estamos caminhando para um desfecho diferente que o desta “piada”, pois, pela quantidade de carros existente em Goiânia, está ficando praticamente impossível movimentar pelas suas ruas; voltaremos em breve para os tempos da Goiânia que conheci quando aqui cheguei nos idos de 1960: circulávamos a pé e na maior tranquilidade, por toda a cidade.

Naquele tempo não tínhamos pressa e ainda não era proibido caminhar pelas ruas!

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