MINHAS CRÔNICAS

quinta-feira, 1 de julho de 2010

LONDRES, Visita à casa de um diplomata do século 19

Em 1855, Carvalho Moreira, mais tarde Barão de Penedo, então embaixador do Brasil nos Estados Unidos, foi indicado para o posto de Ministro do Império brasileiro junto à Corte da Rainha Vitória.
Tarefa muito difícil, tendo em vista as dificuldades diplomáticas que as duas nações estavam vivendo; o Brasil, sendo a parte mais fraca desta contenda, sentia muito mais a força do poder econômico inglês, o país hegemônico da economia mundial da época.
Havia sido, recentemente, editado o “bill (projeto de lei) Aberdeen” pelo qual foi transferida para os tribunais ingleses a jurisdição dos navios negreiros e autorizava, também, que os navios ingleses entrassem em águas territoriais brasileiras e, até mesmo, em nosso solo, na caçada ao tráfico escravo.
Foi com este clima que o Barão de Penedo apresentou suas credenciais a S. M. Rainha Vitória no dia 5 de setembro de 1855; chegava, no entanto, para o cargo com a confiança do Marquês de Paraná, então presidente do Conselho de Ministros do governo Imperial do Brasil: “A remoção de V.Excia. para o posto que ora ocupa é a maior prova de confiança que o Governo Imperial lhe podia dar”.
Barão de Penedo tinha consciência de que a razão da sua remoção para Londres era a necessidade de se captar grande volume de capitais para o Brasil, destinados a promover o progresso econômico do Império, principalmente na área de construção de estradas de ferro e, também, tentar amenizar os efeitos do “bill Aberdeen”, cuja implementação expunha a grande chaga da nossa nacionalidade – os negros escravos.
Penedo revelou ser um grande estrategista de negócios, credencial essencial para quem precisasse se envolver com empréstimos para o governo brasileiro, que, aliás, vinham sendo negociados e renegociados desde Dom Pedro I, senão vejamos:
Em 1829 Dom Pedro I tomou empréstimo para pagar os empréstimos de 1824 e 1825; em 1859 Dom Pedro II, agora com negociação de Penedo, pediu empréstimo para pagar as 400.000 libras do empréstimo de 1829, cujo valor atualizado passou a ser de 508.000 libras (não haviam sido pagos nem os juros); para se eliminar uma dívida, fazia-se outra maior; era a o inicio da roda viva das nossas finanças.
Em 1863 o governo brasileiro, pelos cálculos oficiais, devia 2.700.000 libras; o Marquês de Abrantes, então Ministro da Fazenda, com o intuito de consertar as finanças, pede para o Barão de Penedo conseguir-lhe um empréstimo junto aos banqueiros de Londres no valor de 3.200.000 libras (os excedentes 500.000 seriam para diminuir as obrigações internas); em 1875, novamente Penedo negociou com os Rothschild, para fechar a conta da impagável dívida externa, empréstimo de cinco milhões de libras.
Diante de tamanha capacidade de negociar, não poderia haver pessoa mais indicada para ajudar Couto de Magalhães na empreitada que ele resolveu enfrentar em 1876 (conseguir empréstimo junto ao mundo financeiro de Londres para construir a estrada de ferro, cuja concessão ele havia recebido de Dom Pedro II), do que o embaixador do Brasil em Londres, seu irmão de maçonaria e amigo de muitos dos seus amigos, como o Visconde de Ouro Preto e Francisco Otaviano
No livro “Couto de Magalhães – o Último desbravador do Império” faço a narrativa do encontro entre os dois e, principalmente, descrevo a residência de Barão de Penedo – A embaixada do Brasil Imperial em Londres.
Naquela manhã o dia estava nublado, como acontece com muita frequência em Londres. Felizmente estávamos adequadamente agasalhados; havíamos, Hélio Junior e eu, atravessado o Jardim St. James Park e estávamos caminhando na direção do Palácio de Buckinghan, onde pretendíamos assistir o espetáculo da “troca de guardas” quando nos demos conta que estávamos na vizinhança de Grosvenor Gardens, onde se localizava a antiga embaixada do Brasil no século 19, residência do Barão de Penedo que citamos acima.
Seria este sitio o último relacionado com o roteiro que adrede traçamos para visitar, com o intuito de conferir, pessoalmente, as informações que passara aos leitores do meu livro acima citado e que haviam sido baseadas nas minhas lembranças de antigo morador de Londres e, principalmente, nas pesquisas efetuadas para este desiderato.
Como escritor, tenho a visão de que escrever um livro é como um filho que colocamos no mundo; somos eternamente responsáveis por ele; cada vez que corremos os olhos por suas páginas vem à nossa mente a emoção daquela frase que colocamos no papel, da supressão daquela palavra que não exprimia com rigor o que queríamos dizer, a procura do adjetivo que nos ajudasse a definir aquela nossa emoção momentânea.
Rever (só a conhecia por fotografia de livros) a antiga embaixada brasileira trouxe-me, realmente, grande emoção; Hélio Junior, astuto observador e companheiro do nosso longo contubérnio, entendeu o momento e ficou em silêncio, possivelmente observando
minhas reações; depois pediu que me postasse em frente do prédio e fez algumas fotografias.
Adentramos o edifício, graças à gentileza de um funcionário que trabalhava na sua remodelação; fiquei feliz por certificar-me que havia retratado no meu livro quase todos os detalhes que via agora, alguns deles, inclusive, por pura intuição: “dois lances de escadas davam acesso ao andar superior, a sala de jantar; a escadaria com balaustres entrelaçados com ramos verdes, formando vivo contraste com o veludo carmesim que encobria o seu corrimão”.
Acreditem, descia aquelas escadarias o casal, ele, o Barão “com casaca comprida, camisas de golas reviradas, gravata borboleta”; ela a Baronesa, “simplesmente deslumbrante, vestido brocado azul e branco, cabelos repartidos em bandós, terminando em cachos até os ombros, um colar de brilhantes envolvia o pescoço de cútis branca, porém cheio de vida”.
Parafraseando Oscar Wilde sinto que neste capítulo do meu livro - desenhei o perfil dos mortais e remontei seus ambientes, com a pretensão que meus leitores conversassem com eles, como eu fiz; tentei revesti-los de imortalidade – Eis a tarefa do escritor.


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