MINHAS CRÔNICAS

quinta-feira, 8 de março de 2012

SOU ATEU!

                     
                  
               Não faz muito tempo, lembro-me que foi numa destas tarde-noites, em que nos reunimos em tertúlias que acontecem após as sessões administrativas da Academia Goiana de Letras, ao redor da mesa de chá, café e algumas guloseimas, para discutir assuntos ligados à cultura e ao intelecto.
                   O assunto que foi suscitado por um dos acadêmicos presentes eletrizou a reunião, a discussão a respeito da fé; alguns dias depois, o meu querido confrade Dr. Ursulino Leão presenteou-me com um livro que me tem ajudado na reflexão sobre esta problemática, trata-se de “Em defesa de Deus, Karen Armstrong, Ed. Cia. Da Letras, 2009”.
                        Quando se discute a fé é necessário ter em conta a sua contra face, ou seja, a ausência da fé; aquele que acredita, que tem crença, tem sido definido, erroneamente, como o que aceita as doutrinas religiosas, sendo os mesmos chamados de “crentes” por aceitar “em confiança” dogmas estabelecidos por esta ou aquela religião.
                        Esta interpretação fez surgir nos tempos modernos, mais acentuadamente na segunda metade do século XX, dois fenômenos que estão cada vez mais presentes nas discussões religiosas, políticas e filosóficas: o fundamentalismo religioso e o ateísmo, ambos, por serem hermeneuticamente antagônicos, possuem forças suficientes para sustentar suas respectivas posições e manter a discussão.
                        No livro que citei acima a autora faz um enunciado que nos obriga a fazer reflexões antes de colocarmo-nos de um dos lados da dicotomia fé e ateísmo – “Uma das condições para obter conhecimento sempre foi a disposição de abandonar o que pensamos que sabemos a fim de avaliar verdades que nunca sequer imaginamos”.
                       Interessa-me, no momento, discutir o assunto ateísmo que, como sabemos, surgiu com força durante o século XIX e foi impulsionado para as rodas políticas e filosóficas no inicio do século XX com Marx, Nietzsche e Freud, dentre outros. 
                        Sei que o título deste texto é instigante, porém preciso esclarecer que não o endosso, pois, pelo contrário, creio no Grande Arquiteto do Universo; embora tenha pontos de contatos filosóficos com o pensamento Deísta, me julgo no direito de não rejeitar, como eles rejeitam, as religiões que levem ao encontro de uma “convivência criativa, pacífica e até prazerosa com realidades que não são facilmente explicáveis e com problemas que não conseguimos resolver: mortalidade, dor, sofrimento, desespero, indignação em face da injustiça e da crueldade da vida” (livro citado acima).
                        Há algumas semanas atendi em meu consultório médico um casal que se tornou meus amigos; ela apresentava um problema intestinal que poderia lhe trazer preocupações para o futuro, ele que viera apenas como companhia da esposa, era um engenheiro-fazendeiro de bom nível intelectual e, sobretudo cultural.
                         Durante as discussões que permearam a consulta ele me disse com muita convicção: sou ateu, aliás, cada vez acredito menos em um Deus por não existir provas da sua existência!
                        - Você vivencia as coisas que acontecem na sua fazenda? Perguntei-lhe, sob o olhar atento da sua esposa que, por certo não comungava com as suas ideias. Lance os olhos ao seu derredor; por exemplo, você já parou para ver uma vaca dar cria a um bezerro? Esta é uma das provas da existência de Deus; vou lhe contar o que vi:
                        Acho que tudo o que a vaca faz durante as horas que antecedem, durante e após a parição não é racional, é instintivo; ela faz centenas de movimentos, caminha para frente e para trás, para, deita, levanta; ajeita com as patas dianteiras o capim aonde o bezerro irá “cair”; em seguida à parição, acontece o milagre da natureza, a vaca dá um passo para frente (nunca para trás, pois poderia pisotear o bezerro), vira-se, examina-o e cheira-o.
                        A fase seguinte é a mais importante, o bezerro recém-nascido respira ofegante pela presença de secreções ou mesmo parte da bolsa uterina que lhe cobre o nariz, parece que vai morrer sufocado; de imediato a vaca começa a lamber-lhe, iniciando, instintivamente, justamente pelo seu nariz, retirando as secreções que lhe impediam a respiração.
                        Que força é esta que impele a vaca a seguir este roteiro? Por que ela inicia a lamber pelo nariz e não pela parte traseira do bezerro?  Darwin explica isto, é o instinto da preservação da espécie, afirma-me o fazendeiro; de minha parte, respondi-lhe, sempre desconfio das certezas, cultivo, nos assuntos da fé, o valor da dúvida, prefiro acreditar em um Ser Superior.
                        Venha comigo, vou fazer a colonoscopia (exame endoscópico do intestino) na sua esposa e gostaria que você presenciasse algo que acho difícil Darwin explicar; este aparelho possui uma câmara filmadora na sua extremidade distal e à medida que “caminha” pelo interior do intestino, vai enviando as imagens (ampliadas muitas vezes) para o monitor, onde o médico assistente observa possíveis alterações do relevo interno da alça (tumores, processos inflamatórios etc.).
                        Ao iniciarmos o exame, colocamos este pequeno sensor na extremidade (ponta) de um dos dedos do paciente, que registra os seus batimentos cardíacos, cuja audição é ampliada por este pequeno monitor (oxímetro); este acontecimento é um milagre, não da ciência que consegue fabricar esta aparelhagem, mas sim de quem “fabricou” o ser humano com tamanha meticulosidade, onde uma minúscula artéria situada na pontinha de um dos dedos pulsa no mesmo ritmo do coração.
                        Veja aqui a miríade de veias e artérias que são visíveis pela ajuda desta aparelhagem, todas, absolutamente todas, têm alguma função no organismo; veja aquela um pouquinho mais calibrosa que aparece ali do lado direito, olhe as pulsações que ela apresenta e observe comigo que acontece no mesmo ritmo daquela que pulsa na ponta do dedo e todas elas, no mesmo ritmo do coração, conforme estamos ouvindo pelo oxímetro.
                        Não sei se os dois exemplos lhe tocaram, porém gostaria de dar-lhe mais um, agora dentro da sua área de atuação, as ciências exatas, tendo em vista que a maioria dos argumentos que é utilizada pelos agnósticos é a necessidade de se ter fé para acreditar no Ser Supremo.
                        Boa parte do que os físicos nucleares dizem é verdadeiro e pode ser comprovado, mas, às vezes, não é razoável ou racional; não se pode dizer que é razoável ou racional a afirmativa de que a mesma partícula nuclear pode passar por dois orifícios diferentes ao mesmo tempo.
                        Não seria o caso de repetir com o Apóstolo Paulo quando afirma na epístola aos Hebreus: “A fé é a garantia daquilo que é almejado, a convicção daquilo que não é visto”.     

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