MINHAS CRÔNICAS

segunda-feira, 30 de julho de 2012

CAMINHAR PELAS RUAS DE PARIS NO VERÃO






                          Em Paris, alguns anos atrás, não me lembro com certeza da data, sei que era uma época em que eu vivia a procura de ilusões e era verão, isto eu sei; caminhava, imitando um “Flâneur” (caminhar por diversão) na companhia de Marília pelo Boulevard Saint-Germain; suas ruas largas e cheias de luminosidade nesta época do ano transformam o caminhar em verdadeiro prazer.

                               Normalmente o turista ao caminhar por Paris define com antecedência a rota a ser seguida; o “flâneur” não se submete a esta orientação, sua caminhada não depende de destino, às vezes durante esta jornada resolve parar em um café e fica observando o que ocorre na rua à sua frente.

                            Sabíamos que a Rua L’Odeon deveria estar naquelas imediações, dobramos a esquerda e entramos à procura do local onde existiu, até o inicio da segunda guerra mundial, a livraria “Shakespeare and Company” de propriedade da norte-americana Sylvia Beach.

                           Não tínhamos pressa; o compasso das nossas passadas era ditado pela nossa ociosidade, discutíamos os acontecimentos ocorridos naquela livraria nas décadas de 1930 e 1940, principalmente a presença constante de incontável número de escritores e pintores, tais como Hemingway, James Joyce, Gertrude Stein, Sherwood Anderson, Picasso, e muitos outros; ao passarmos em frente ao número 12, ecoou, vinda da eternidade da existência a voz de Hemingway:

                               “Em um frio vento de rua, este era um lugar quente e alegre com um grande fogão no inverno. Mesas e prateleiras de livros, livros novos na janela, e fotografias na parede de famosos escritores mortos e vivos – Paris, Uma Festa móvel”.

                            A temperatura estava começando a diminuir, pois o sol já se escondera por detrás dos prédios; continuamos nossa caminhada e entramos na rue St. Sulpice  e, instintivamente, sentamos a uma mesa colocada na calçada de um “café”;  sentimos que estávamos em porto seguro, pois o tempo não conta naquelas paragens, desde que o freguês consuma alguma coisa, às vezes um simples café será o suficiente para se ocupar uma mesa por quantas horas se deseje.

                            Pedimos uma garrafa de champanha!

                            Ficamos durante algum tempo em silêncio observando as pessoas que subiam e desciam a rua, do outro lado da calçada, encostados em uma mureta, um casal de namorados trocavam carícias, davam risadas e, de vez em quando se beijavam, indiferentes ao mundo que continuava, para eles, multicolorido; um pouco mais distante, uma pequena praça toda arborizada , onde coseguimos ver várias senhoras idosas que caminhavam a passos lentos em sua direção, o sino da igreja de St. Sulpice começou a badalar chamando-as para as preces das 18 horas.

                               Um homem magro, alto, portando um chapéu de aba estreita, porém, com a copa muito alta, bigode espesso que tentava entrar nas suas narinas, trajando um terno surrado, porém, bem alinhado, sentou-se a uma mesa bem do nosso lado; tenho “quase que certeza” de que foi ele a figura pintada por Paul Cézanne (Os jogadores de Cartas, 1839-1906) que vi ontem no Louvre; ao retirar o chapéu expôs a calvície que tomava conta de todo o topo da sua cabeça; ao acender o cachimbo, inexplicavelmente de cor branca, não tive mais dúvida, era ele, realmente, o modelo pintado por aquele artista.

                               Colocou sobre a mesa sua pasta “démodé” (fora de moda) modelo James Bond, pediu um café, abriu a dita cuja, retirou um livro e começou a lê-lo; o seu título, que consegui ver de onde estávamos “The Greater Journey – David McCullough” traiu-o, se ainda me restava alguma dúvida quanto àquela minha suspeita, esta se dissipou; provavelmente ele procurava naquela leitura, o seu criador, Cézanne, pois o livro conta algumas curiosidades de Paris e de seus moradores nos anos de 1830-1900.

                               Um vento frio, porém suave, varria com delicadeza, como se fosse a vassoura conduzida pelas mãos suaves e bondosas da minha mãe  limpando o terreiro de frente a nossa casa em Gaspar Lopes, as folhas da calçada.

                               Ficamos ali por algum tempo, quanto tempo? Não sei! Porém este detalhe não tem importância dentro da circunstância do momento vivido; quando resolvemos ir embora, o personagem de Cézanne continuava “bebendo” a mesma xícara de café, completamente absorto na leitura do seu livro. Será que ele nos viu?

                               A vida, repetindo Hemingway (Paris é uma Festa) “me tinha parecido tão simples naquela tarde! Mas Paris era uma cidade muito antiga, éramos jovens e nada ali era simples”.

                               Só aquele momento foi simples e não mais se repetirá, pois o minuto que passou não volta mais!




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