MINHAS CRÔNICAS

terça-feira, 6 de julho de 2010

LONDRES – good bye, see you soon (Adeus, reencontraremos breve)

Na verdade havíamos planejado ir ao Café Royal, localizado na Regent Street, local onde Couto de Magalhães não quis levar sua namorada Lily, conforme relato no meu livro biográfico sobre esta personalidade da época do Império; porém, tivemos uma desagradável surpresa; o local onde ele estaria localizado, como adrede sabíamos, não mais ostentava a bela imagem que conhecíamos por fotografias antigas que descobrimos na internet.
Informaram-nos nas imediações que o Café Royal, que funcionou ali por quase cento e cinquenta anos foi fechado e o prédio vendido para uma companhia de incorporações para construção de um possível hotel; como estávamos nas imediações de Piccadilly Circus, procuramos as escadarias do monumento que sustenta o famoso cupido de Londres e sentamos, Hélio Junior e eu, enquanto contava a ele o significado daquele café para a cidade de Londres.
Nos séculos 19 e 20 era o ponto de convergência de toda a sociedade londrina; frequentava aquele bar-restaurante as figuras mais representativas das letras e das artes, destacando-se, dentre eles, Winston Churchill e Oscar Wilde que, inclusive, tinha uma mesa cativa que a casa lhe reservava.
Os biógrafos de Wilde dizem que ali ele promovia festas homéricas para seus convidados; seu vestuário, completamente fora dos padrões da era Vitoriana, escandalizava os frequentadores: era um autêntico “dandy”.
É, também, neste café que Wilde se encontrava com lorde Alfred Douglas, conhecido na intimidade por Bosie e cujo relacionamento (homossexual) levou Oscar Wilde à ruína (prisão com trabalhos forçados), graças à intensa perseguição que lhe fez o Marquês de Qeensberry, pai de Bosie.
Foi na prisão que Wilde escreveu seu último trabalho em prosa, uma das mais belas páginas da literatura mundial “De Profundis”, aliás, de maneira inacreditável, pois, segundo a rotina da prisão, o presidiário, no caso Wilde, deveria escrever em papel que lhe era fornecido e no final do dia, era obrigado a devolver para o carcereiro, tanto o papel escrito como a caneta que utilizou, recebendo-os de volta na manhã seguinte.
Ao ler este monumento literário, achamos extraordinário o fato de ele conseguir dar sequência ao que escrevia, sem acesso ao que escrevera no dia anterior; foram oitenta páginas preenchidas com letras miúdas e o texto foi concluído sem nenhuma revisão.
Neste documento, dirigido ao lorde Alfred Douglas, ele tentou – como ele próprio havia declarado, explicar sua conduta sem tentar defendê-la, como disse seu filho Vyvyan Holland em 1949.
Voltamos para o Hotel caminhando e fazendo as últimas observações sobre a cidade de Londres, discutindo sobre tudo o que vimos naqueles dias tão agradáveis que passamos ali e com a promessa de voltarmos, agora acompanhados de Marília e Larissa.
Como nosso horário de vôo do dia seguinte era muito cedo, achamos prudente jantarmos no próprio hotel; aliás, foi a melhor coisa que fizemos, não só pelo ambiente maravilhoso, mas, também, pela ótima comida; digna de uma despedida feliz!
Vestimos nossos melhores trajes e descemos para o bar, enquanto aguardávamos que desocupasse a mesa que havíamos reservado; pedimos dois “martinis”, levando em consideração que não se deve tomar nada muito forte, como aperitivo, se estamos planejando, como estávamos, tomar vinho na refeição; lembrei-me e repeti para o Hélio Junior o que escreveu o norteamericano Fitzgerald em “A Festa de noivado”:
- Eles beberam cocktails antes do jantar, vinhos como os franceses, cerveja como os alemães e whiskey como os ingleses –
Já sentados à mesa, procuramos subsídios do maitre para escolhermos o prato; sugeriu-nos um cordeiro, segundo ele, o seu preferido do dia; após acordarmos com a indicação, o somelier se aproximou e passamos a discutir qual vinho escolher.
O cordeiro, como sabemos, é uma carne versátil para se acompanhar de vinho, de preferência um tinto; indagamos a respeito de um Zinfandel; o somellier da casa não era do tipo snob como frequentemente costuma ser, apoiou nossa indicação, com uma expressão usual aos bons profissionais - Grande escolha, será um fantástico vinho, aduzindo – Vocês escolheram a uva, agora eu escolho o vinho!
Sugiro Rabbit Ridge e acrescento, se ainda não sabem: - Todo vinho Zinfandel tinto iniciado com a letra R ou terminado em ELLI é bom.
Abriu o vinho, serviu nossas taças até a metade e postou-se, com dignidade profissional, ao lado da mesa com a garrafa na mão, esperando nosso teste gustativo; antes que fizéssemos qualquer movimento, deu-nos outra “dica”, piscando o olho com certa intimidade: - Se um dos senhores, por qualquer motivo, deseja impressionar o seu convidado, olhe sério para o somellier e diga com polidez, porém com convicção:
- Acho que o vinho necessita de um pequeno tempo de descanso para se acostumar com a taça!
Com este jantar maravilhoso, nós nos despedimos de Londres; no dia seguinte voltamos para o Brasil.


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