MINHAS CRÔNICAS

segunda-feira, 27 de janeiro de 2014

TRADIÇÕES E ESQUISITICES DOS INGLÊSES

                                      Os ingleses são considerados um dos povos que mais cultuam suas tradições, algumas  até estranhas, diga-se de passagem, para não dizer esquisitas, sob o ponto de vista de nós brasileiros. Só para lembrar, uma delas é o fanatismo com que o Inglês observa o horário das suas atividades, às vezes até as comesinhas do seu dia-a-dia.
                                     O Hyde Park, famoso jardim londrino, como todos os parques e jardins, são de “propriedade” da Rainha ou do Rei de plantão; naquele logradouro há um espaço “Hyde Park Corner” onde, aos domingos, junta uma multidão para ouvir os famosos “speakers”(oradores) que,  por qualquer motivo, sobem em um caixote e fazem discursos a favor ou contra, sobre todas as coisas (movimento gay, partidos políticos, enchente no Paquistão, etc.)
                                    Existe apenas uma objeção: não se pode falar mal da “proprietária(o)” do Parque; porém, esta proibição somente vigora se o orador estiver com os pés no chão, se subir em um caixote, pode falar à vontade e o que quiser; como goiano cabe a pergunta, tem base?
                                Além de serem aferrados às suas tradições, ou talvez por isto, algumas coisas só acontecem com os ingleses; recentemente li o livro “Curiosities of Literature, John Sutherland, 2009) e um dos assuntos enfocados pelo autor chamou-me a atenção pelo inusitado do acontecimento; falava ele sobre o famoso poeta e novelista inglês Thomas Hardy, considerado como o “último dos grandes Vitorianos”, alusão ao tempo da Rainha Vitória.
                                   Hardy nasceu em Dorset (Stinsford) no ano de 1840 e morreu em 1928; foi casado por duas vezes (Florence Dugdale e Emma Gifford) e a temática dos seus textos era carregada de pessimismo; existe hoje uma sociedade que leva e cultiva o seu nome - “Thomas Hardy Society” fundada em 1968, com intensa programação cultural, inclusive com publicação de um jornal, que conta com a colaboração de expoentes da literatura da Inglaterra.
                                   Pois bem, nosso herói foi protagonista de um episódio até hoje ainda não completamente esclarecido; para dizer a verdade, ele não foi o culpado, literalmente falando, da ocorrência, pois isto se deu depois da sua morte; na evolução da narrativa os leitores entenderão a razão da expressão “literalmente  falando” que utilizei acima.
                                   Tudo começou alguns anos antes da sua morte.  Hardy escreveu um documento informando, a quem pudesse interessar, que ele desejava, depois de morto, é claro, ser enterrado em sua cidade natal, local onde ele  sempre foi homenageado e, principalmente, queria permanecer ao lado da sua primeira esposa, que foi o grande amor da sua vida.
                                   No entanto, baseado no que os costumes convencionavam (aliás, por tradição os Ingleses não possuem uma constituição escrita) o pároco encarregado do possível sepultamento, achou melhor perguntar a Sra. Emma Gilfford (a segunda esposa de Hardy) se ela estava de acordo com o que queriam fazer com o corpo do seu falecido esposo.
                                   Aqui peço permissão para utilizar aquela expressão que mencionei no inicio deste texto (literalmente); os leitores hão de convir comigo que Hardy deveria saber que esta sua vontade (ser enterrado ao lado da primeira esposa) deveria causar manifestação de desagrado na segunda. Foi o que ocorreu, a Sra. Emma não aceitou de maneira alguma este fato e, para não dizerem que estava com ciúmes, ela apelou para o renome nacional do falecido – Ele era considerado o grande poeta e escritor da época, era um nome nacional e não apenas regional e merecia, portanto, ser enterrado na Westminster Abbey, ao lado dos grandes poetas da pátria.
                                   Finalmente, depois de muita discussão, adotou-se a solução salomônica: retiraria o seu coração (que seria enterrado na sua terra natal) e o seu corpo foi cremado e as cinzas levadas para a catedral de Westminster, onde ali continua, como Emma desejava.
                                   Não precisa se dizer que o acontecimento (retirada do coração do morto) provocou enorme reboliço no seio da sociedade Inglesa, alguns considerando isto um sacrilégio e mesmo um barbarismo, semelhantemente ao que faziam os Mayas.
                                   O mais hilário (se é que se podem definir estes acontecimentos como hilários) foram os disse-me-disse que passou a circular no meio da população: após a retirada do coração, este foi removido da sua casa pelo seu médico pessoal e guardado em uma lata de biscoitos a qual o gato de estimação do Sr. Hardy teve acesso e como estava com fome, resolveu come-lo; dia seguinte, ao verificarem que a lata de biscoito estava vazia, sem nenhum comentário, torceram o pescoço do gato e levaram a lata para ser enterrada, sem o conteúdo precioso: o coração de Hardy.
                                   Para tentar dar um fim neste falatório, a Hardy Society resolveu fazer uma investigação séria sobre o assunto e concluíram com um comunicado: nenhuma destas versões são verdadeiras, pois qual gato seria tão grande   para conseguir comer um coração humano e principalmente, como ele conseguiria abrir a lata de biscoito? Algumas testemunhas foram arroladas e depuseram que o cobweb (era a raça do gato) sobreviveu por muitos anos após estes acontecimentos.
                                   Outra prova cabal apresentada pela Hardy Society foi a fatídica lata de biscoito que foi encontrada, provavelmente em escavações, em 1960, juntamente com um bilhete do Sr. Bertie (era o nome do jardineiro de Hardy) onde dizia que aquela lata continha, realmente, o coração do seu patrão; foram encontradas algumas gotas de sangue nas suas bordas, cujo estudo de DNA comprovou a afirmativa do Sr.Bertie.
                                   Não falei de outra faceta da personalidade do inglês: sua capacidade de fazer ironia diante de situações adversas; desta vez foram as descrições dos dizeres da lata de biscoito que continuaram a circular entre a população – Em cima da tampa da lata e nas suas laterais, havia vários desenhos de gatinhos, incluindo um deles, retratado em movimento de captura de um pássaro.
                                   Daqui para frente é serviço para a Scotland Yard, teriam dito os diretores da “Thomas Hardy Society”, entregando os pontos!

                                                     



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