CHARLES DICKENS E SEUS PERSONAGENS ASMÁTICOS
O escritor inglês Charles
Dickens que viveu no século 19 (1812/1870) é considerado, por muitos
apreciadores da literatura, o maior novelista da época vitoriana e
provavelmente, ao lado de Shakespeare, o mais popular escritor da língua inglesa
de todos os tempos.
Viveu
grande parte da sua vida em Londres, em plena época da revolução industrial,
quando o ar era carregado de fumaça e “fog”, portanto prejudicial à saúde,
principalmente às pessoas suscetíveis a problemas respiratórios, que era o seu
caso, pois sofria de asma desde a infância.
Dickens
foi um inovador na literatura, foi o pioneiro no gênero de história (novela)
semanal, cujos capítulos eram publicados em fascículos, em jornais de grande
circulação e com uma inovação, aliás, seguida hoje pelos autores de novelas da
televisão, ele acompanhava a reação do público aos seus personagens e, de
acordo com isto, ele modificava as suas ações na trama.
Conta-se
que sua esposa, ao acompanhar pelo jornal a desenvoltura da personagem Miss Mowcher
no romance “David Coperfield” que apresentava problemas físicos que não
melhoravam no desenrolar da trama e por ser ela, a sua esposa, uma quiroprática
(especialidade que se propõe a tratar problemas físicos com ginástica),
provavelmente sentiu que ele estava fazendo propaganda contra a sua profissão.
A partir desta intervenção, Miss Mowcher passou a ter melhor desenvoltura
física.
Dickens
conviveu com a asma durante quase toda sua vida, e nas correspondências que
mantinha com amigos e parentes, o tema era recorrente; citava as noites em que
ele não conseguia dormir pela constante tosse e para tanto usava doses
excessivas de oleáceos, que era o remédio popularmente utilizado no tratamento
desta doença, naquela época.
Para
deixar claro o quanto este problema de saúde o incomodava, Dickens costumava “acometer”
alguns de seus personagens com esta doença; o mais emblemático deles é o Sr.
Omer, presente no seu livro autobiográfico – David Coperfield.
A
cena ocorreu quando o narrador (no caso Dickens) foi para a cidade de Yarmouth
e lá se encontrou com o proprietário de um shopping (Sr. Omer) quando travaram
o seguinte diálogo: (tradução livre, resumida)
-
Eu pude ver, dentro do shop, a figura do senhor Omer fumando um cachimbo, no
salão perto da porta; entrei e perguntei-lhe como estava passando. Agradeço
pela minha vida e pela minha alma, disse ele, acrescentando - como vai você?
Tome uma cadeira; o fumo não lhe desagrada, eu espero! De maneira alguma,
disse, eu gosto de ver pessoas fumando.
Por que não usa você mesmo? Após
dizer estas palavras o senhor Omer começou a rir; você tem razão, é um mau
hábito para um jovem. Eu fumo para minha asma.
O
senhor Omer manteve-se atencioso para comigo, ele agora estava sentado,
respirando profundamente, aspirando o cachimbo como se nele estivesse o suprimento necessário para viver e sem o qual
ele, provavelmente, morreria.
Veja-me!
Meu vento pode acabar a qualquer momento e eu não gostaria disto; eu sei para
onde meu vento irá e quando ele consegue fazer isto é como um par de foles
insuflando o ar”.
Outro
personagem de Dickens que era asmático é Mr. Sleary, na novela “Hard Times”;
este senhor, já idoso e etilista, era proprietário de um circo, tinha um gênio
agradável e comunicativo e adotava uma interessante filosofia de vida: - A vida
não pode ser somente para o trabalho e nenhuma diversão.
Dickens,
ao descrevê-lo, disse: - Mr. Sleary, que tinha problemas com a asma e cuja
respiração, que parecia ser muito grossa e pesada, vinha lá do fundo, emitindo
um som semelhante ao que acontece quando se pronuncia a letra S.
As
pessoas que fazem crítica literária, muitas vezes nos surpreendem pelas suas
análises; conseguem perceber detalhes que o leitor comum na alcança; meu
confrade na Academia Goiana de Letras, Prof. José Fernandes, um dos melhores
críticos literários da nossa região, ao analisar o livro “Maya”, de autoria do
nosso outro confrade Dr. Ursulino Leão, revelou-nos alguns detalhes intrigantes
da trama que o autor havia escondido nas entrelinhas.
Vez
por outra, alguns destes críticos também exageram nas “descobertas”, não
consigo me lembrar do nome do autor que “viu” na famosa frase - Por favor, senhor, eu preciso de um pouco mais! - proferida pelo pequeno herói
de um dos melhores livros de Dickens (Oliver Twist), a revelação de uma crise
asmática do autor.
Segundo
aquele crítico, o menino (no caso, Dickens), estava precisando de ar e não,
mais comida, que era o que o menino (Oliver) estava pedindo ao cozinheiro do
orfanato onde ele estava morando!
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