MINHAS CRÔNICAS

sexta-feira, 24 de setembro de 2010

ROSA AMÉLIA, um amor de muitos donos (Será?)

Da última vez que conversei com meus leitores sobre este assunto que vou enfocar hoje, apresentei-lhes o Alirio, porém, esqueci-me de mencionar que ele residia no arraial “Poleiro de Pomba” situado, como vimos, do outro lado do “rio Muzambo”, não muito distante da casa de Rosa Amélia.
Depois daquele encontro na festa de São João, não mais se aproximaram; não por culpa dela, Rosa Amélia, mas sim, por interferência do destino, ajudado nesta empreitada pelas maledicências de alguns amigos e vizinhos.
Bem que ela tentava uma aproximação ou pelo menos uma troca de olhares, nem que fosse de longe; no entanto, sua pretensão, esbarrava na indiferença do Alirio, parecia que ele, propositadamente, procurava se afastar.
Quantas vezes, Rosa Amélia fingindo que estava pescando, sentava-se nos finais de tarde, no barranco do rio e ficava com os olhos fixos na sua curva localizada lá no final do seu olhar, na expectativa que uma canoa trouxesse no seu bojo um passageiro especial; algumas vezes esta pessoa veio, porém, exagerando na esquivança, a canoa procurava beirar o outro lado da margem.
Estranho o magnetismo do amor; parece que quanto maior é o desprezo, maior é a afeição e a insistência na procura da conquista; não sabemos se é uma tentativa de dar sobrevivência ao amor próprio que foi ferido ou a repetição daquilo que os namorados, secularmente, fazem para conquistar o amor sublimado.
Rosa Amélia não desistia do seu intento de descobrir o que ocorrera com os sentimentos do autor de tão lindas estrofes por ele cantadas ao redor da fogueira, naquele São João da Fazenda Mata da Fartura; mal sabia ela que fuxicaram sobre sua vida nos ouvidos de Alirio.
Era uma tarde sossegada, mansa e silenciosa, destas que só sabe avaliar quem mora no sertão; sentia-se, na face, a suavidade da aragem que soprava com mansidão e gentileza, agitando, na sua passagem, com carinho, os ramos e algumas flores que neles se agarravam como se fossem o ultimo liame de salvação e na expectativa de não serem arrastados pelas águas do rio, imitando os náufragos que seguram, na tentativa de se salvarem, em qualquer objeto que aparece.
Se fôssemos dar ouvidos aos poetas, poderíamos repetir o que eles dizem: era um silêncio de morte!
Se estamos dando ouvidos aos poetas, ouçamos, também, os filósofos e coloquemos no pensamento de Rosa Amélia o que eles falariam: Quem está morrendo é a esperança!
A certeza deste seu pensamento ocorreu quando Alirio, sem nenhuma explicação, mudou o trajeto da sua canoa e passou bem perto da margem onde ela estava; com velocidade dada pela quase nenhuma correnteza, violão em punho, cantou com todas as forças do seu pulmão:

Lagoa de águas paradas
Serve de pouso até para andorinha
O que você pensa, moça,
Meu coração advinha

Rio que corre com águas sujas
Canoeiro nenhum pode beber
Um amor com tantos donos
O melhor que faço é esquecer.

Alirio ainda deu uma estirada de olhos para o lado do barranco do rio, porém, com um olhar que não transmitia melúria; ficou de pé na canoa, manejou com força o varejão e singrou as águas sem olhar para trás; porém, levou-a, no pensamento, na sua companhia, sem poder responder a sua própria indagação: - Qual será o mistério que ela possui que me obriga a mante-la na lembrança, não despegá-la do pensamento, fazer suposições de estar em sua companhia onde não estou?
Não havia mais dúvida no espírito de Rosa Amélia que a razão do afastamento do Alirio estava na própria letra da canção, envenenaram o seu espírito com inverdades; o que poderia ser minha Nossa Senhora da Luz!
Os dias passaram, Rosa Amélia não se recuperava da angustia que lhe esmagava o peito; não tinha para quem se queixar, pois, como sabemos, o mal de amor provoca feridas que cicatrizam sem a interferência de estranhos.
Não podemos dizer que Alirio, também, não sofria com esta situação, aliás, se ele fosse mais letrado, teria lido as palavras de apoio ao seu estado de espírito, escritas pelo genial escritor francês La Rochefoucauld: “O ciúme é, de qualquer maneira, justo e razoável, porque tende apenas a conservar um bem que nos pertence ou acreditamos nos pertencer”.
Por conhecer, como narrador, o desenrolar deste idílio, peço licença ao mesmo escritor acima mencionado para repetir, também, o que ele disse:
“É extraordinário como o ciúme, que passa seu tempo a construir pequenas suposições no falso, tem pouca imaginação quando se trata de descobrir o verdadeiro”.





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