MINHAS CRÔNICAS

segunda-feira, 29 de novembro de 2010

GASPAR LOPES E OS GASPARLOPENSES (de outrora)

“Seus cinqüenta e seis quilos chegaram ao píer, que pareceu balançar e curvar-se ao impacto da sua beleza. Alguns carregadores desmaiaram. Um tubarão enorme e sentimental, que vinha seguindo o navio, saltou desesperado por sobre as ondas na tentativa de vê-la de novo, e mergulhou, amargurado, nas profundezas do oceano. Rags Martins Jones estava chegando!
“Vinte e quatro contos.
F.Scott Fitzgerald”.

Não me lembro do mês, na verdade não consigo saber nem mesmo o ano; só sei que era um domingo, pois estávamos, Batuque, José Olegário, Joaquim “Saquinho” e parece que o Nelson, irmão do Servinho, ouvindo o programa “A hora do pato” da radio nacional, todos sentados em bancos de madeira, no interior da venda do Sr. Ângelo Agostini.
- Vai mudar para cá a família de um tal Sr. Alvino; dizem que sua filha é muito bonita! Diz, sem nenhuma segunda intenção, o Zé Olegário.
- Nóis vai mudar mesmo, mas quero alertar que minha irmã Geralda não é do “bico” de qualquer marmanjo não! Dito isto, um jovem de voz pausada e meio as- sobiada se levanta, deixando ver, até com certo exibicionismo, uma faca presa à cintura.
Não recordo se a Geralda se casou com alguém de Gaspar Lopes, sei que aquele intrépido jovem chamado Jorge, enturmou-se, de maneira definitiva, com os demais da sua geração, vindo a ser, inclusive, jogador, parece que “beque de espera” ou “center-for” do nosso querido e glorioso Brasil Futebol Clube.
Além da Geralda, viviam em Gaspar Lopes muitas moças e meninas bonitas. Lembro-me de algumas delas, como a Manuelina do Sr. Jorge Bonifácio, possuidora de cabelos longos e cacheados, que muitas vezes eram contidos por tranças que terminavam por fitas coloridas. Não faz muito tempo voltei a Gaspar Lopes e passei em frente da casa da Manuelina; “pareceu-me” vê-la na janela, com olhar distante, observando os transeuntes que passavam por debaixo dos seus olhos; não contive, fotografei sua casa.
Aliás, nas imediações da casa da Manuelina, morava outra moça muito bonita; seu nome: Ofélia Agostini; poucos se aventuravam a fazer-lhe a corte, pois ela era de família considerada abastada, portanto...
Maria, filha do Sr. José Pedro, nossa vizinha e amiga da minha irmã Lucy, vestia-se com simplicidade, como determinavam as posses da família, porém, era dotada de uma formosura cativante. Muitos anos atrás a reencontrei aqui em Goiânia, casada com o Ramon Ribeiro, filho do Sr. Sebastião Ribeiro; o Ramon, naquela época, era funcionário das Furnas; Maria continuava meiga e gentil!
Raquel, filha do Sr. Sebastião Ribeiro era tida, por todos nós, como possuidora de rosto parecido com o da Maria Montez, famosa estrela de Hollywood, de origem mexicana; no entanto seus irmãos eram muito bravos! Muitas vezes fui à sua casa, com desculpa de comprar pombas que o Ronaldo, seu irmão, vendia. Somente...
Nas imediações de Gaspar Lopes vivia o Sr. Antonio Ricardo, fazendeiro de boas posses; costumava, junto com toda a família, freqüentar o comércio e principalmente as nossas festas de igreja. Uma das suas filhas, parece que de nome Alina, fazia muita gente da nossa geração suspirar...
Logo depois da segunda guerra mundial, período que corresponde, mais ou menos, a época que estamos nos referindo, poderia se repetir o que Scott Fitzgerald escreveu no seu famoso livro Neste lado do Paraíso: “Eis aqui uma nova geração que, ao tornar-se adulta, encontrou todos os Deuses mortos, todas as guerras terminadas, toda a fé do homem abalada”.
Era o fim de uma era, operava-se uma verdadeira revolução nos hábitos e nos costumes; as mulheres, a partir daí, passaram a adquirir mais liberdade nas suas movimentações; as jovens não precisavam esperar, pacientemente, a chegada de um amor romântico, de um “jovem direito” que a conduzisse ao altar. A nova onda dava-lhe permissão para, também ela, ir “à luta” à procura do seu próprio destino.
As moças de Gaspar Lopes acompanharam a onda?
Parece que não!
Iam, quando muito, fazer o “footing” na estação da Rede Mineira de Viação. O trem de passageiros que vinha de Três Corações chegava a Gaspar Lopes no cair da noite; seu tempo de parada, parece que era em torno de quarenta e cinco minutos, o suficiente para se observar o movimento, matar a curiosidade a respeito dos chegadores, dos que faziam baldeação, no outro lado da plataforma, para outro trem rumo à Alfenas e Machado.
A desculpa para ver a movimentação na estação, encobria, também, o desejo de rever “alguém” do próprio lugar, trocar olhares furtivos, que embutiam mensagens secretas...
O passado não foi apenas sério, permeado por possíveis dificuldades existenciais, foi, também, alegre quando podia sê-lo, criativo quando as necessidades mostravam ser esta a única saída; romântico, quando embalado por correntes de paixões protagonizadas por personagens, vestígios de personagens, que o tempo apagou...

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