MINHAS CRÔNICAS

quinta-feira, 4 de agosto de 2011

Hemingway - entrevista concedida há 57 anos!

Dias atrás, antes de começar a reunião do Conselho de Administração da Unicred Goiânia, conversava com meu amigo, o médico e membro recém-eleito para a Academia Goiana de Medicina, Clidenor Gomes Filho, a respeito do escritor norteamericano Ernest Hemingway; falávamos sobre a sua obra literária e, também, sobre a vida desregrada que ele sempre levou.

A discussão foi provocada por eu ter-lhe mostrado uma das relíquias do meu arquivo cultural, uma edição de 1958 da revista “The Paris Review” onde era exibida uma entrevista feita com Hemingway em um café em Madri, no mês de maio de 1954, colhida por um jornalista de nome George Plimpton, um dos fundadores daquela revista.

Falar sobre a vida literária deste famoso escritor é ser repetitivo, pois, sua obra soma mais de duas dezenas de títulos, alguns muito conhecidos pelos brasileiros (O velho e o mar, Adeus às armas, Por quem os sinos dobram, dentre tantas outras); o arguto jornalista procurou, naquela histórica entrevista, fugir do lugar comum de tantas outras que foram publicadas, evitando focar as perguntas exclusivamente sobre seus livros.

Foi uma longa entrevista, em que falaram sobre quase tudo que envolvia a vida do escritor, tanto no presente (1954) como no passado; algumas perguntas poderiam ser consideradas embaraçosas, tendo em vista o gênio explosivo de Hemingway, outras intimistas (sua vida pessoal) e na maioria delas (felizmente para os interessados nas entrelinhas da produção do escritor) falaram sobre os passos para a concretização de uma obra literária.

- Você costuma reescrever o texto presumivelmente pronto? Quantas vezes você reescreve?

- Depende, a última página de “Adeus às armas” reescrevi 30 vezes antes de ficar satisfeito.

- Você me disse que seus melhores escritos surgem quando você está amando, explique melhor isto.

- Você pode escrever a qualquer hora se as pessoas não te interromperem e te deixarem em paz, porém, não há duvida, os melhores escritos surgem quando você está amando.

Como sabemos, Hemingway viveu durante algum tempo em Paris, especialmente nos anos vinte e trinta do século passado, época de ouro da cultura francesa, pois, por esta ocasião viveram ali algumas das grandes celebridades das artes e da literatura mundial, que se reuniam em cafés (Flore, Deux Magots) liam os existencialistas, descobriam os surrealistas e moravam em quartos na Rive Gauche.

Não faz muito tempo ouvi de um colunista do Diário da Manhã a afirmativa que, também eu, gostaria de repeti-la: “Sinto inveja daquela geração de escritores que viveu em Paris nos anos de 1930”.

Leiam a pergunta e “ouçam” a resposta dada por Hemingway ao jornalista, quando foi questionado sobre este assunto.

- Em Paris dos anos trinta, havia algum “sentimento de grupo” entre escritores, pintores, enfim, entre os artistas que viviam ali naquela época?

- Não, não havia “sentimento de grupo”, havia apenas respeito mútuo entre nós, alguns da minha idade, outros mais velhos, como Picasso, Braque, Monet, Joyce, Ezra, etc.

Outro fato que me deixou intrigado nesta entrevista foi o posicionamento de Hemingway no questionamento que lhe fez o entrevistador a respeito do seu relacionamento com a também escritora Gertrude Stein; sente-se claramente que ele ainda mantinha mágoa com o ocorrido entre os dois há mais de 20 anos.

- Qual foi a influência exercida por Gertrude Stein na sua obra?

- Desculpe, porém, não sou muito bom em discutir assuntos de pessoas que já morreram. A senhorita Stein escreveu bastante e sempre faltando com a verdade acerca da sua influência no meu trabalho; acredito que foi importante para ela escrever isto, porque todos sabem que ela aprendeu a escrever diálogos de seus personagens, após ler o meu livro “O sol também se levanta”. A senhorita Stein não tinha nada de novo para me ensinar.

Para que os leitores entendam este entrevero é preciso que se diga que Gertrude Stein foi uma das mais famosas e populares escritoras entre os que viviam em Paris naquela época; sua casa era uma espécie de santuário para artistas e escritores e sua fama aumentou muito depois que ela inventou a escrita automática, no estilo abstrato, considerada por alguns como o “cubismo” da escrita e é da sua lavra estes versos maravilhosos, “Uma rosa é uma rosa é uma rosa”.

Hemingway, como conta Sylvia Beach (The Shakespeare and Company, 1959), ao chegar a Paris, completamente desconhecido, fez de tudo para ser recebido por Gertrude Stein em sua casa (porta aberta para o sucesso), só conseguindo graças à intervenção de alguns amigos, inclusive Sylvia; porém Stein, semelhantemente a Hemingway, tinha o gênio muito difícil e acabaram se desentendo.

Conta ainda Sylvia que em fins de 1930 ela levou um agoniado Hemingway à casa de Stein, pois ele desejava fazer as pazes com ela e não tinha coragem de ir sozinho; “depois do encontro, ele disse que estava tudo bem entre os dois agora”.

Como se pode observar, com esta entrevista, não parece que tudo terminou do jeito que Hemingway afirmara; ficaram sequelas que o tempo não cicatrizou!

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