MINHAS CRÔNICAS

quinta-feira, 26 de novembro de 2009

BANHO DE MATRINCHÃ PARA DESPISTAR ESPOSA CIUMENTA

Aruanã, Julho de 1996



Chegamos, mais ou menos, às 15 horas ao acampamento, em Aruanã cerca de meio dia,; impossível passar em brancas nuvens por aquelas paragens, há o inevitável “bar do Elpidio”.
Carlos Sardinas, médico venezuelano, meu companheiro de viagem, mostrou-se interessado em conhecer o ambiente; depois de ser apresentado a alguns habitués do lugar, umas tantas cervejas faz parte do ritual de aproximação.
Cabelo, barqueiro que foi enviado pelo Olay para buscar-nos, informa que a distância até o acampamento é pequena e o tempo necessário para alcançá-lo será de, mais ou menos, 30 minutos (os leitores devem ter observado que todas as informações atinentes ao tempo são relativas).
Se estiverem dispostos, façam as contas e descobrirão que o tempo gasto para conhecer o ambiente foi um pouco dilatado, porém, é necessário levar em consideração o segundo item da questão: conhecer alguns frequentadores do lugar.
Estavam no recinto, dentro outros, meus amigos Marcão Bufaiçal, Omary e João Minhoca, Costa Campos e o Juarez Lobo e, mais tarde, (pouca coisa mais tarde!) o Joãozinho Teixeira.
O clima nas barrancas do Araguaia exerce uma influência extraordinária para o bom relacionamento das pessoas; de repente, um magistrado da maior envergadura nos tribunais, passa a ser nominado, com todo o respeito, de Dr. Frescura.
Com o Carlos não foi diferente, a barreira da língua foi quebrada com o “portunhol” fluentemente balbuciado por todos os presentes, inclusive pelo balconista cunhado do Elpidio:
- Queres una otra lôra?
- Tu tienes tambien esto? Por Dios, tô no cielo!
Carlos manifestou o desejo de, também, deixar uma mensagem na “parede de recados”, Juarez, o mais fluente no portunhol, sugeriu que ele escrevesse uma poesia, pois somente era admitido escrever ali, pessoas que realmente tivessem alguma coisa para dizer para a posteridade, no que foi muito aplaudido por todos os “bebuns”, inclusive pelos ribeirinhos, já participando ativamente das discussões, inclusive, arriscando dar alguns palpites sobre todos os assuntos.
Carlos aceitou o repto e escreveu um possível poema, em espanhol, que ninguém conseguiu entender, acredito que nem ele, nestas alturas já “para lá de Bagdá”.
De vez em quando o Cabelo dava o ar da graça e chamava-nos para ir embora, pois, conhecendo o Grande Chefe Olay, sabia que ele já adivinhara o que estava causando aquela demora e, quando lá chegasse, seria uma bronca das maiores.
João Minhoca, profundo conhecedor da língua de Cervantes, tentava, antes de partirmos, contar ao Carlos alguns “macetes” para despistar a esposa ciumenta:
- Yo soio tujo amigo, ok?
- Por presupuesto que si!
- Entonce entienda my historita!
Pelo olhar do Carlos e principalmente pelo barulho dos “bebuns”, não me parecia que iria entender, passei “entonces” a verter para o espanhol a história do João, mesmo porque, por conhecê-lo há tanto tempo, sabia que ele não nos deixaria partir, antes de contar sua história e, na despedida, cantar, chorando “Saudades de Jaraguá”.
Ei-la:
“Já faz algum tempo, fizemos uma ótima pescaria de matrinchãs que pegamos nas imediações de um cardume (quando ele diz imediações, na verdade, entenda-se no olho do furacão do cardume) e antes de voltarmos para Goiânia, tomamos umas e outras aqui no Bar do Elpidio e ao jogar “conversa fora” descobrimos que na beira da estrada, nas imediações de Itauçu havia um pagode que estava dando o que falar.
Sem nenhuma maldade, apenas para descansar um pouco da viagem, paramos (não vou dizer o nome da companheirada que estava comigo, porque sou leal) no dito cujo; não sei bem se era saudade de casa ou se as moças que estavam dançando eram realmente muito atraentes. Caímos na fuzarca!
Na hora de irmos embora, alertamos um dos companheiros que o perfume das “muchachas” (João fez questão que não se traduzisse para moças) estava exalando do seu corpo com muita saliência; o que fazer? Banho não iria adiantar, como afiançou um dos companheiros e o pior, na chegada em casa a cara metade iria perceber de longe.
Solução? Juntou umas duas ou três matrinchãs, tirou a roupa e esfregou-as no corpo, sem dó nem piedade.
A chegada em casa foi tranquila, o companheiro dormiu em quarto separado, pelo forte cheiro que exalava; o difícil foi “desinfetar” o corpo daquele cheiro que durou mais de uma semana.
Na chegada ao acampamento fomos recepcionados com grande carinho pelo casal Olay e Neusa (A Deusa do Araguaia)!

sexta-feira, 20 de novembro de 2009

Brincar de Artista

Dedicado ao pediatra Dr. Daniel de Almeida


De todas as nossas brincadeiras de criança, uma exercia maior magia: brincar de artista.
Juntávamos a meninada, acredito que a maioria dos da nossa idade e, após a divisão em dois grupos, sempre sob o comando de Zé Olegário, saíamos em desabalada carreira à procura dos refúgios que, previamente, fazíamos nas encostas dos barrancos, no meio da nossa plantação de milho, em cima das árvores, dependendo da capacidade do grupo ou de uma determinada liderança.
O Zé Olegário era imbatível nestes arranjos e, o grupo que saía com ele, dificilmente perdia; ele "bolava" um sistema de túneis interligados entre si, que constituíam verdadeiros labirintos; se acontecia de se descobrir a “boca” de um deles, ficávamos sempre temerosos de entrar para "prender" o antagonista, havia o risco de o Zé Olegário ter armado alguma cilada e o "prendedor" acabava preso e amordaçado no buraco, até terminar a brincadeira.
Algumas vezes, na correria para esconder-nos, caíamos em algum buraco, devidamente camuflado por capim que o Zé Olegário programava.
Se perdíamos pontos com estas “invenções”, contrabalançávamos esta nossa fragilidade, com as estratégias do Pedro meu primo: maior velocidade, maior capacidade de rastejar, maior coragem para subir em árvores e, principalmente, melhor sistema de comunicação (duas pequenas latas unidas entre si por uma linha de costura, por onde conversávamos à maneira de um telefone).
Todos os lances das brincadeiras baseavam-se nas histórias dos filmes que assistíamos no cinema do Sr. Jorge Braga.
O Jarbas, irmão do Zé Olegário, descobriu em uma oportunidade, justamente na ocasião em que os filmes de Tarzan movimentavam as telas do cine São Jorge, um enorme vale, com grande profundidade e, por sorte, bem no seu fundo uma grande árvore.
Só faltava o cipó, que foi substituído por uma corda e estava pronto o ambiente para o Tarzan atravessar o vale de um lado para o outro. Viagem maravilhosa! Sentia-se o vento bater de encontro ao nosso rosto e a sensação de dono do espaço.
Não é necessário realçar os riscos que advinham com estes vôos, era necessário ter coragem para enfrentar esse desafio; não se podia titubear na hora de largar a corda, ao chegar do outro lado do vale; se não houvesse o sincronismo perfeito: soltar a corda e jogar o corpo para frente poderia ocorrer uma queda de costas para o fundo do vale.
Se, ao chegar do outro lado, por qualquer motivo não se soltasse, o impulso da volta não era suficiente para chegar ao lugar de origem, resultado: ficava-se dependurado a uns 5 metros do solo, tendo como única saída, soltar-se e cair sobre um terreno perigoso (paus, espinhos, água).
Pelo menos em uma oportunidade me lembro de que o Sebastião Maracanã levou uma queda e ficou desacordado (?) durante algum tempo, foi um Deus nos acuda!
Quando o indivíduo perseguido era visto, imediatamente ouvia a voz de prisão: “Monsuar”; com esta expressão pensávamos que estávamos falando na língua que ouvíamos no cinema (inglesa) e que queria dizer: “mãos ao ar”; o “preso” ficava estacionado onde estivesse e, em seguida, outra palavra de ordem era proferida: “cameni boy” (venha para cá), se entregava e era amarrado com as mãos para trás e só era solto no final da brincadeira.
Não havia intenção de machucar uns aos outros; tanto é verdade que esta brincadeira era uma das nossas preferidas, usávamos revólveres de pau e as cordas eram feitas de cipó imbira.
É, o tempo passou, quando olho para o meu passado que parece tão distante e ao mesmo tempo tão presente nas minhas reminiscências, sinto saudade e imagino, consultando minhas elucubrações: Eu era feliz e não sabia!

quarta-feira, 11 de novembro de 2009

DEIXE-ME CONTAR ENQUANTO ME LEMBRO

Brincar de Artista
Dedicado ao pediatra Dr. Daniel de Almeida


De todas as nossas brincadeiras de criança, uma exercia maior magia: brincar de artista.
Juntávamos a meninada, acredito que a maioria dos da nossa idade e, após a divisão em dois grupos, sempre sob o comando de Zé Olegário, saíamos em desabalada carreira à procura dos refúgios que, previamente, fazíamos nas encostas dos barrancos, no meio da nossa plantação de milho, em cima das árvores, dependendo da capacidade do grupo ou de uma determinada liderança.
O Zé Olegário era imbatível nestes arranjos e, o grupo que saía com ele, dificilmente perdia; ele "bolava" um sistema de túneis interligados entre si, que constituíam verdadeiros labirintos; se acontecia de se descobrir a “boca” de um deles, ficávamos sempre temerosos de entrar para "prender" o antagonista, havia o risco de o Zé Olegário ter armado alguma cilada e o "prendedor" acabava preso e amordaçado no buraco, até terminar a brincadeira.
Algumas vezes, na correria para esconder-nos, caíamos em algum buraco, devidamente camuflado por capim que o Zé Olegário programava.
Se perdíamos pontos com estas “invenções”, contrabalançávamos esta nossa fragilidade, com as estratégias do Pedro meu primo: maior velocidade, maior capacidade de rastejar, maior coragem para subir em árvores e, principalmente, melhor sistema de comunicação (duas pequenas latas unidas entre si por uma linha de costura, por onde conversávamos à maneira de um telefone).
Todos os lances das brincadeiras baseavam-se nas histórias dos filmes que assistíamos no cinema do Sr. Jorge Braga.
O Jarbas, irmão do Zé Olegário, descobriu em uma oportunidade, justamente na ocasião em que os filmes de Tarzan movimentavam as telas do cine São Jorge, um enorme vale, com grande profundidade e, por sorte, bem no seu fundo uma grande árvore.
Só faltava o cipó, que foi substituído por uma corda e estava pronto o ambiente para o Tarzan atravessar o vale de um lado para o outro. Viagem maravilhosa! Sentia-se o vento bater de encontro ao nosso rosto e a sensação de dono do espaço.
Não é necessário realçar os riscos que advinham com estes vôos, era necessário ter coragem para enfrentar esse desafio; não se podia titubear na hora de largar a corda, ao chegar do outro lado do vale; se não houvesse o sincronismo perfeito: soltar a corda e jogar o corpo para frente poderia ocorrer uma queda de costas para o fundo do vale.
Se, ao chegar do outro lado, por qualquer motivo não se soltasse, o impulso da volta não era suficiente para chegar ao lugar de origem, resultado: ficava-se dependurado a uns 5 metros do solo, tendo como única saída, soltar-se e cair sobre um terreno perigoso (paus, espinhos, água).
Pelo menos em uma oportunidade me lembro de que o Sebastião Maracanã levou uma queda e ficou desacordado (?) durante algum tempo, foi um Deus nos acuda!
Quando o indivíduo perseguido era visto, imediatamente ouvia a voz de prisão: “Monsuar”; com esta expressão pensávamos que estávamos falando na língua que ouvíamos no cinema (inglesa) e que queria dizer: “mãos ao ar”; o “preso” ficava estacionado onde estivesse e, em seguida, outra palavra de ordem era proferida: “cameni boy” (venha para cá), se entregava e era amarrado com as mãos para trás e só era solto no final da brincadeira.
Não havia intenção de machucar uns aos outros; tanto é verdade que esta brincadeira era uma das nossas preferidas, usávamos revólveres de pau e as cordas eram feitas de cipó imbira.
É, o tempo passou, quando olho para o meu passado que parece tão distante e ao mesmo tempo tão presente nas minhas reminiscências, sinto saudade e imagino, consultando minhas elucubrações: Eu era feliz e não sabia!

Brincar de Artista DEIXE-ME CONTAR ENQUANTO ME LEMBRO

Brincar de Artista
Dedicado ao pediatra Dr. Daniel de Almeida


De todas as nossas brincadeiras de criança, uma exercia maior magia: brincar de artista.
Juntávamos a meninada, acredito que a maioria dos da nossa idade e, após a divisão em dois grupos, sempre sob o comando de Zé Olegário, saíamos em desabalada carreira à procura dos refúgios que, previamente, fazíamos nas encostas dos barrancos, no meio da nossa plantação de milho, em cima das árvores, dependendo da capacidade do grupo ou de uma determinada liderança.
O Zé Olegário era imbatível nestes arranjos e, o grupo que saía com ele, dificilmente perdia; ele "bolava" um sistema de túneis interligados entre si, que constituíam verdadeiros labirintos; se acontecia de se descobrir a “boca” de um deles, ficávamos sempre temerosos de entrar para "prender" o antagonista, havia o risco de o Zé Olegário ter armado alguma cilada e o "prendedor" acabava preso e amordaçado no buraco, até terminar a brincadeira.
Algumas vezes, na correria para esconder-nos, caíamos em algum buraco, devidamente camuflado por capim que o Zé Olegário programava.
Se perdíamos pontos com estas “invenções”, contrabalançávamos esta nossa fragilidade, com as estratégias do Pedro meu primo: maior velocidade, maior capacidade de rastejar, maior coragem para subir em árvores e, principalmente, melhor sistema de comunicação (duas pequenas latas unidas entre si por uma linha de costura, por onde conversávamos à maneira de um telefone).
Todos os lances das brincadeiras baseavam-se nas histórias dos filmes que assistíamos no cinema do Sr. Jorge Braga.
O Jarbas, irmão do Zé Olegário, descobriu em uma oportunidade, justamente na ocasião em que os filmes de Tarzan movimentavam as telas do cine São Jorge, um enorme vale, com grande profundidade e, por sorte, bem no seu fundo uma grande árvore.
Só faltava o cipó, que foi substituído por uma corda e estava pronto o ambiente para o Tarzan atravessar o vale de um lado para o outro. Viagem maravilhosa! Sentia-se o vento bater de encontro ao nosso rosto e a sensação de dono do espaço.
Não é necessário realçar os riscos que advinham com estes vôos, era necessário ter coragem para enfrentar esse desafio; não se podia titubear na hora de largar a corda, ao chegar do outro lado do vale; se não houvesse o sincronismo perfeito: soltar a corda e jogar o corpo para frente poderia ocorrer uma queda de costas para o fundo do vale.
Se, ao chegar do outro lado, por qualquer motivo não se soltasse, o impulso da volta não era suficiente para chegar ao lugar de origem, resultado: ficava-se dependurado a uns 5 metros do solo, tendo como única saída, soltar-se e cair sobre um terreno perigoso (paus, espinhos, água).
Pelo menos em uma oportunidade me lembro de que o Sebastião Maracanã levou uma queda e ficou desacordado (?) durante algum tempo, foi um Deus nos acuda!
Quando o indivíduo perseguido era visto, imediatamente ouvia a voz de prisão: “Monsuar”; com esta expressão pensávamos que estávamos falando na língua que ouvíamos no cinema (inglesa) e que queria dizer: “mãos ao ar”; o “preso” ficava estacionado onde estivesse e, em seguida, outra palavra de ordem era proferida: “cameni boy” (venha para cá), se entregava e era amarrado com as mãos para trás e só era solto no final da brincadeira.
Não havia intenção de machucar uns aos outros; tanto é verdade que esta brincadeira era uma das nossas preferidas, usávamos revólveres de pau e as cordas eram feitas de cipó imbira.
É, o tempo passou, quando olho para o meu passado que parece tão distante e ao mesmo tempo tão presente nas minhas reminiscências, sinto saudade e imagino, consultando minhas elucubrações: Eu era feliz e não sabia!