MINHAS CRÔNICAS

segunda-feira, 21 de novembro de 2011

MOLTO AGITATO

Infelizmente não tenho conhecimento musical suficiente para discutir o assunto ópera, porém, sempre que posso, procuro assistir uma ou outra apresentação; desta vez não foi diferente, aproveitamos (Marília e eu) nossa estada em Nova York e fomos tentar assistir “Ana Bolena”.

Disse-o bem, fomos tentar, porque na verdade não conseguimos ingressos, embora tenhamos usado todas as artimanhas possíveis para consegui-los; ao chegarmos às bilheterias do “Metropolitan Ópera” informaram-nos que os mesmos já estavam esgotados, porém, se tivéssemos paciência e, sobretudo um pouco de sorte, poderíamos tentar a fila da lista de espera, na expectativa de desistência de alguém.

Enquanto aguardávamos, felizmente sentados em confortáveis poltronas, encontrei um livro na livraria do teatro que me chamou a atenção; comprei-o e iniciei a sua leitura; tratava-se do relato da escritora Johanna Fieldler, cujo título, “Molto Agitato” e a leitura do seu prólogo, deixavam claro a intenção da autora: contar fatos pitorescos ligados ao mundo dos cantores, regentes de orquestras, produtores e dirigentes do “Metropolitan Ópera”, desde sua fundação em 1880.

Na volta, aqui no Brasil, continuei a ler o intrigante livro, cuja autora havia trabalhado por quinze anos junto à administração do teatro; portanto, tinha muito conhecimento dos bastidores como se pode observar nesta passagem em que ela fala a respeito da personalidade de Pavarotti:

“Pavarotti era temperamental e nervoso, algumas vezes agia como criança birrenta; chegava ao Metropolitan com a sua secretária, sua nutricionista e quase sempre com dois agentes de imprensa que o assessoravam, cumprimentava poucas pessoas e se dirigia para o camarim de onde saía apenas para cantar; algumas vezes cancelava apresentações na última hora; não era respeitoso com seus colegas, aconteceu mais de uma vez, no meio de um dueto de amor, ao sentir sede, caminhava para fora do palco para buscar água, deixando a soprano em pânico”.

Por ter muito interesse em assuntos sobre a 1ª. guerra mundial chamou-me a atenção, sobremaneira, o capítulo que ela dedica a este acontecimento e sua repercussão sobre o funcionamento do teatro; leiam comigo, resumidamente, o que ela diz:

“Antes dos Estados Unidos entrarem na guerra em 1917, Giulio Gatti, o diretor geral do Metropolitan vinha recebendo pressão, que ele resistia, para cancelar as óperas alemãs que estavam programadas e dispensar os artistas oriundos daquele país, porém, após a declaração de guerra, ele não conseguiu, embora tentasse, que as apresentações da ópera “Parsifal” do compositor alemão Richard Wagner não fosse interrompida, tendo em vista a xenofobia contra os teutônicos que passou a imperar nos Estados Unidos”.

É de se salientar, no entanto, que a imprensa, neste e em outros episódios semelhantes, tenha se colocado do lado do diretor com o argumento que infelizmente não prevaleceu, de que Bach, Wagner, Beethoven e Brahms se colocam no mesmo patamar da cultura mundial que Shakespeare e Dante; sequencialmente, entre 1917-1918, cerca de quarenta e cinco óperas de autores alemães foram canceladas.

Por esta mesma ocasião o Metropolitan recebeu ordem do governo americano para deixar o teatro às escuras uma vez por semana (às segundas-feiras), no sentido de economizar combustível; como este dia da semana era considerado o de maior impacto social, houve enorme resistência do público; embora os americanos fossem patriotas e mesmo xenófilos, não aceitaram que a guerra tivesse interferência na sua vida social.

A primeira guerra mundial terminou no dia 11 de novembro de 1918, coincidentemente no dia em que, adrede programado, abria-se oficialmente a temporada de óperas do Metropolitan; Giulio Gatti, naquela época o diretor do teatro, programou para esta apresentação a ópera “Sansão e Dalila”, sob a regência do maestro francês Pierre Monteux; Enrico Caruso foi o tenor e Louise Homer a soprano; era a triunfal homenagem à França vitoriosa na guerra.

Antes de concluir este texto, acredito que alguns leitores podem estar se perguntando: eles conseguiram os ingressos?

Infelizmente não, porém, fomos informados que naquela mesma noite, em plena “Times Square”, na Broadway, o espetáculo seria transmitido ao vivo, direto para três enormes telões montados ao ar livre; é de surpresar o cético emperdenido. Sentamos em confortáveis cadeiras adrede colocadas em plena praça, na companhia de mais de três mil pessoas e assistimos, estupefatos, sem nada gastar, a maravilhosa exibição.

Foram quase três horas que ficarão inolvidáveis nas nossas lembranças, pois vivemos, juntos com o público que estava ali, todas as emoções da “avant premiére” de Ana Bolena, com aplausos, vozes em grita (bravos! bravos!) nos intervalos, como se estivéssemos no interior do Metropolitan.

sexta-feira, 11 de novembro de 2011

COINCIDÊNCIAS! SERÁ?

Há poucos dias li neste jornal uma crônica (Só Deus explica) de autoria do Professor José Fernandes, meu confrade da Academia Goiana de Letras, que me deixou bastante satisfeito, não só pelo seu elegante, aliás, costumeiro, estilo literário, mas, também, pelo inusitado da situação por ele narrada.

Quando falo em satisfeito é porque episódio semelhante ao que ele debuxou com mão de mestre, já ocorreu comigo, em mais de uma oportunidade, portanto, me sinto em boa companhia; quando discuto com algum conhecido sobre este fato, sou surpreendido pela narrativa de acontecimentos semelhantes, também, com outras pessoas.

Antes de descrever o meu “caso” vamos ouvir o Professor José Fernandes na sua narrativa (resumidamente):

Há pouco mais de um mês estava ele, juntamente com a sua esposa, Da. Sônia, procurando um lugar para se acomodarem nas escadarias do Vaticano, na companhia de enorme quantidade de pessoas que ali se aglomerava com o mesmo desiderato: descansar um pouco das longas caminhadas que são infligidas aos turistas.

Sentaram-se, espremidos, porém, agradecidos pela graça de terem encontrado aquele espaço; tomaram um pouco de água e continuaram a discutir sobre os próximos programas que empreenderiam pela cidade eterna; de repente, uma pessoa que estava nas suas imediações, não resistiu à tentação e questionou-os:

Vocês são brasileiros?

Diante da resposta positiva, entabularam a seguinte conversação: - Eu, também sou, disse-lhe o até agora estrangeiro, porém, hoje moro aqui em Trieste, sou Padre; ah você é padre? Eu estudei em seminário claretiano na juventude; onde? Rio Claro; interessante, eu também estudei lá; qual é o seu nome? Cláudio Gregianin! Tive um colega de turma com este nome; acho que sou eu mesmo, você não é o José Fernandes, conhecido como Baldan? Você se lembra do Teruo, goleiro do nosso time? Claro que me lembro, e do Padre Orlando? Nossa, lembro demais!

Resumo, os dois foram colegas de estudos 50 anos atrás!

Estávamos, Marília e eu, há cerca de dois meses, visitando um vinhedo na região de Mendonza, na Argentina; seguíamos o roteiro que todos os turistas seguem: um guia vai à frente explicando todos os detalhes do funcionamento da destilaria enquanto os turistas (em nosso caso éramos oito pessoas) vão atrás, agrupados, ouvindo com atenção e tentando apreender o máximo possível os “sábios ensinamentos” para depois, na primeira oportunidade que surgir, normalmente em alguma rodada de degustação de vinhos, exporem seus conhecimentos para os amigos.

Depois de percorrermos todo o percurso, sentamo-nos ao redor de um balcão para degustarmos alguns vinhos; após termos passado algum tempo juntos naquela “viagem pelo mundo do vinho”, com pouca oportunidade de trocarmos algumas palavras com as pessoas que nos faziam companhia, achei que devia puxar “alguns dedos de prosa”.

- Nós, somos mineiros, disse o rapaz que mais perguntas havia feito ao guia; sou goiano de coração, porém, mineiro de nascimento, retruquei; de onde? Quis saber o conterrâneo; nasci no município de Alfenas; meu avô trabalhou na Rede Mineira de Viação, nos idos de 1950, em um lugar perto de Alfenas, se não me engano, Gaspar Lopes, retrucou meu novo amigo; qual era o nome do seu avô? Senhor Magno, disse-me ele; então, sua avó chamava-se Da. Ilma e sua bisavó Da. Quinha e o senhor Magno foi chefe de estação, portanto “patrão” de meu pai, conhecido por Nico guarda-chave!

Se algum dia desejarmos conhecer um pouco mais de nós mesmos, do nosso inconsciente, devemos seguir a pegadas deixadas por Freud e voltarmos ao passado, à nossa infância; aquele reencontro me levou de volta ao meu mundo de antigamente, aquelas figuras que enumerei acima, fizeram parte, indelevelmente, de um pedaço da minha vida.

A ciência descoberta por Freud, a psicanálise, tem interesse em promover um diálogo entre o passado e o presente, daí a luz que se lança para a sua analogia com a arqueologia; não é por acaso que ele, Freud, era colecionador de objetos de artes antigas, oriundas do Egito, Grécia, Roma e do Oriente.

Na época em que ele fugiu para a Inglaterra, havia acumulado mais de 2.000 peças de “deuses velhos e encardidos, parte integrante da sua vida” e, segundo dizem seus biógrafos, o Professor Freud gostava de segurar as peças em suas mãos, além de que se preocupava em mantê-las, sempre, com a mesma disposição sobre a sua mesa de trabalho.

Não é do meu interesse, por faltar-me formação especializada, discutir as intricadas nuances psicanalíticas daquele meu encontro com os novos amigos mineiros; o que me tira o fôlego e acredito que também ocorreu com meu amigo Prof. José Fernandes, é o assombro que nos causou aqueles encontros.

Como podem ocorrer fenômenos semelhantes àqueles? Que força estranha nos aproximou, a mim, dos mineiros e o Prof. José Fernandes daquele padre?

Um amigo, com quem discuto, de vez em quando, assuntos sobre religião, me disse certa vez: Os espíritos desencarnados povoam os espaços e com os quais mantemos contato sem suspeitar, como acontece com o nosso mundo invisível que enxergamos apenas com o uso do microscópio; eles, os espíritos, conservam os afetos sérios que tinham na terra e se alegram de estar ao lado dos que amaram.

Se a alma ou espírito está ao nosso redor, pode provocar em duas pessoas que se encontram pela primeira vez, como foi o meu caso, auras positivas, facilitando a aproximação, ou então o reencontro, como aconteceu com o Prof. José Fernandes.

Para as duas situações, roubo o final da crônica do meu confrade e repito com ele: - Semper Deo gratias et Mariae!

segunda-feira, 7 de novembro de 2011

PROF. JOSÉ FERNANDES, COM O ITAMAR FRANCO FOI DIFERENTE!

Li na semana passada, aqui no Diário da Manhã, o texto “O Brasil fora do Brasil” de autoria do meu confrade da Academia Goiana de Letras, Prof. José Fernandes, onde o mesmo dá vazão ao seu protesto pelo tratamento dispensado pela Embaixada do Brasil em Roma aos movimentos culturais de brasileiros de passagem pela cidade eterna.

O Professor José Fernandes, dentre outros episódios, se refere a dois acontecimentos que destaco por estarem ligados à nossa cultura goiana; o primeiro deles é a respeito do querido escritor, membro da Academia Goiana de Letras, Miguel Jorge, uma das forças vivas da nossa literatura e que estava lançando, com versão em italiano, o seu festejado livro “Vino e sangue” em várias cidades da Itália.

O brasilianista italiano Giovanni Ricciardi, por conhecer a obra de Miguel, fez várias tentativas junto à nossa representação diplomática naquele país, inclusive, pessoalmente com o conselheiro supostamente encarregado dos assuntos culturais, no sentido de promover o lançamento do citado livro na sede da embaixada, porém este se esquivou de fazê-lo.

O outro episódio, que a modéstia do Prof. José Fernandes não permitiu que ele contasse em detalhes, aconteceu com ele mesmo; atendendo convite da Universidade de Nápoles, o Professor pronunciou conferência nas dependências daquela milenar universidade (fundada em 1224), sobre o assunto que o empolga no momento, a ciberpoesia.

Diante do sucesso que ele presenciou e, principalmente, por conhecer a vida literária do Prof. José Fernandes, um das mais fecundas do estado de Goiás, o nosso Giovanni Ricciardi criou coragem e se dirigiu ao nosso Embaixador, solicitando que a nossa embaixada promovesse uma noitada cultural, na qual poderia ser realizada a conferência, já submetida ao crivo da intelligentia da Universidade Italiana. Foi debalde a tentativa!

O título deste meu texto é provocativo, porém me dá a oportunidade de divulgar um episódio ocorrido comigo, cujo desfecho foi completamente diferente do que aconteceu com estes dois luminares da nossa cultura. Conto-lhes:

Em 1996 fui eleito Presidente da International Society of University Colon and Rectal Surgeons, entidade que congregava naquela época, representantes (médicos coloproctologistas) de cinquenta e cinco países; a cerimônia de posse foi marcada para a cidade de Lisboa.

Aliado ao fato de estar orgulhoso pela efeméride (disputei o cargo com dois outros médicos, representantes, respectivamente, dos Estados Unidos e da Itália) achava que era, em última análise, uma homenagem ao nosso país e, porque não dizer, ao nosso Estado de Goiás.

Enviei carta ao Dr. Itamar Franco, naquela época, nosso embaixador em Portugal, dando-lhe detalhes do futuro acontecimento (solenidade de posse a ser realizada no Cassino de Estoril) e pedindo-lhe sustentação logística.

Trinta dias antes do dia aprazado, recebi correspondência da nossa Embaixada, dando conta que o Dr. Itamar Franco não se encontraria em Lisboa na data definida para a solenidade, mas, no entanto, ele encarregara o secretário da Embaixada a dar-me toda a assistência necessária.

Na chegada ao aeroporto de Lisboa, havia um automóvel esperando-me e a minha família, para levar-nos ao Hotel; trinta minutos antes da cerimônia, já no recinto do luxuoso Cassino, recebi a visita do Senhor Secretário da embaixada que, atendendo a recomendação do Dr. Itamar Franco, veio pessoalmente trazer-me o abraço fraternal que ele me enviara, com desejos de sucesso na nova empreitada.

Ao lado deste gesto de cordialidade que me encheu de orgulho por poder mostrar àquela coletividade o respeito do governo brasileiro para com seus cidadãos, pois, de alguma forma eu representava, naquele contexto, o nosso pais, a embaixada patrocinou uma “rodada”de vinhos e alguns salgados para as principais autoridades médicas mundiais ali presentes, extensiva aos membros da minha futura diretoria.

Atendendo a minha solicitação, o chefe do cerimonial convidou o nosso representante legal a tomar assento na mesa diretora dos trabalhos!

São gestos como este, homenagear e, principalmente, prestigiar um modesto médico do interior do Brasil, que mostra a grandeza do nosso ex-presidente Itamar Franco; se voltarmos na história, poderemos nos lembrar de alguns outros episódios que marcaram, indelevelmente, a presença deste mineiro na sua passagem pela política brasileira.

Destaco, apenas para fazer uma interface com o governo da Presidente Dilma, que tem assumido postura semelhante; o afastamento do seu Chefe da Casa Civil Henrique Hargreaves, naquela época com suspeita de cometer irregularidades; depois de esclarecido os fatos, o Ministro voltou muito mais fortalecido.

É bom lembrar que aquele Ministro era um dos maiores amigos de Itamar Franco, tendo acompanhado-o até o momento da sua morte; pesava contra ele apenas uma acusação, não havia provas concretas, no entanto, Itamar fez o que nossos governantes deveriam fazer sempre!

terça-feira, 1 de novembro de 2011

HUGO DE CARVALHO RAMOS E ALLAN POE–ESTILOS SEMELHANTES?

Enquanto aguardávamos o inicio de uma reunião cultural, posse dos novos membros do Conselho Editorial da Editora da PUC Goiás e, principalmente, uma homenagem cultural ao querido escritor Lacordaire Vieira, prematuramente falecido, conversávamos, o escritor e acadêmico da AGL, Edival Lourenço, a Professora Maria de Fátima Gonçalves Lima, um Professor de Literatura da PUC, que acabava de me ser apresentado, cujo nome, por lamentável lapso de memória, não consigo me lembrar, e eu.

Por menos que se queira,quando se reúnem mais de duas pessoas envolvidas com a literatura, o assunto, inevitavelmente, descamba para este mundo maravilhoso; foi o que aconteceu naquela oportunidade.

Foi o escritor Edival quem deu o “mote”; acho, disse ele, que o estilo literário de Hugo de Carvalho Ramos tem pontos de contato com o escritor norte-americano Edgard Allan Poe: os dois exploraram o fantástico nas suas narrativas.

Edival reforça a sua argumentação citando o conto “Ninho de periquitos” incluído na coletânea de contos do livro “Tropas e Boiadas” de Hugo de Carvalho Ramos, onde o narrador provoca no leitor o sentimento de horror, semelhantemente ao que faz Poe em muitas das suas histórias.

A diferença, no entanto, acrescento com o intuito de provocar discussão naquela tertúlia, é que este conto de Hugo de Carvalho Ramos, somente a partir de certa altura da narrativa, provoca no leitor um sentimento de tristeza e principalmente de horror pelo seu possível desfecho, ao passo que em Poe, vemos que a técnica utilizada era um pouco diferente; este autor propugnava pelo que ele denominava de “unidade de efeitos”.

Aqui na tranquilidade da Santa Tereza, com mais vagar e com tempo para consultar minha biblioteca, continuo na busca do possível paralelismo das vidas dos dois escritores; inicialmente constato que Hugo nasceu em 1895, portanto mais de cinquenta anos depois da morte de Poe; com exceção do final das suas vidas, não encontrei entre os dois nenhum ponto de contato que fosse relevante.

Ele, Allan Poe, pensava, como nos ensina José Paulo Paes (Histórias extraordinárias de Edgard Allan Poe – Ed. Cultrix, S.Paulo, 1958), antes de iniciar um conto, no desfecho que seria dado ao mesmo e de acordo com este desfecho, dispunha as cenas de modo a provocar no leitor sensação de ternura, de solidão ou de horror; verdade e beleza são coisas distintas e não deveriam ser misturadas, insistia ele.

Neste conto de Hugo de Carvalho Ramos “Ninho de Periquitos” a técnica utilizada é bem diferente; o narrador provoca, inicialmente, sensação de ternura no leitor (o pai atende ao pedido do filho e vai buscar os filhotes de periquitos que estavam no ninho); sequencialmente, a narrativa torna-se dramática (dentro do ninho havia uma urutu) e finalmente provoca horror (o pai corta o próprio punho para tentar se salvar da picada da cobra venenosa).

Há que considerar, no entanto, que se trata da narrativa de um fato, embora cruel, possível de acontecer, ao passo que em Poe, ele costumava criar uma atmosfera de horror desde o inicio da narrativa, portanto segurando o leitor ao texto, sempre com a expectativa de que algo grave ocorreria, porém este, o leitor, ao conseguir fugir das ciladas da narrativa que o autor conseguia transmitir, se conscientizará que aqueles fatos, na maioria das vezes, são infactíveis.

Como disse no inicio desta narrativa, o final da vida de ambos foi semelhante e principalmente trágica até na precocidade do acontecimento, Hugo com 26 anos de idade e Poe com 40; enquanto Hugo de Carvalho Ramos suicidou-se por enforcamento, depois de ser acometido durante algum tempo de sério problema mental, Allan Poe foi encontrado morto em uma sarjeta em uma cidade dos Estados Unidos (Baltimore).

Não existe comprovação da possível enfermidade mental de Poe, porém podemos encontrar nos seus escritos alguns indícios desta problemática, destacando-se o poema “O corvo”, traduzido para o português por Machado de Assis (Wikipédia); o autor “conversa” com o corvo que adentra a sua casa, atormentando-o com a repetição da frase “nunca mais”.

Provavelmente, sob meu ponto de vista, a maior prova da sua insanidade é a narrativa (uma das últimas que ele fez segundo Flávio Moreira Costa em “Os Melhores contos de loucura, 2007”) O coração delator; dentre outras coisas, ele fala: “É verdade – nervoso, muito nervoso mesmo eu estive e estou, mas por que você vai dizer que estou louco?” A doença exacerbou meus sentidos, não os destruiu, não os embotou”.

Este é mais um capítulo (resumido) do maravilhoso mundo da literatura e dos literatos.