MINHAS CRÔNICAS

quarta-feira, 26 de dezembro de 2012

Discussão sobre Crônicas – (parte III)





                          Ao pesquisar sobre o assunto “crônica“, confesso que fiquei assombrado ao ler o que disse o escritor e jornalista Gustavo Corção na sua página no Diário de Noticias do Rio de Janeiro em outubro de 1958; simplesmente ele disse que Machado de Assis nunca foi cronista, se levarmos em consideração os verbetes dos dicionários que ele, Corção, consultou a respeito da expressão “crônica”.
            Naquele artigo Corção tece comentários, aliás, bastante elogiosos, a respeito das “crônicas” publicadas por Machado de Assis nas páginas do folhetim “A Semana” quase que semanalmente e durante mais de 20 anos (1876 a 1897), acabando por propor, na tentativa de conciliar o que ele disse com o que sempre representou Machado, dividir a crônica em duas categorias: de um lado as crônicas que se submetem aos fatos do cotidiano e do outro lado as que tomam os fatos do cotidiano como pretexto para divagações que escapam à ordem dos tempos.
            Após ter lido (um grande número delas) as crônicas de Machado de Assis, sou forçado a aceitar que as crônicas do “bruxo do Cosme Velho” se enquadram, aceitando a divisão proposta por Corção, naquela segunda categoria de textos; embora Machado procurasse seguir à risca as normativas da feitura das suas crônicas, ele não se submetia ao calendário, às tendências em voga; ele procurava encontrar a eternidade nas coisas efêmeras que merecem nossa atenção, mas quando reclama toda nossa atenção, enfatiza ele, merece riso.
            Vejam, a propósito, o que ele escreveu na sua crônica de 10.7.1892  “...Não gosto que os fatos nem os homens se imponham por si mesmos. Tenho horror a toda superioridade. Eu é que hei de enfeitar com dois ou três adjetivos, uma reminiscência clássica e os mais galões de estilo; os fatos eu é que os hei de aclamar transcendentes; os homens, eu é que os hei de aclamar extraordinários”.
            Suas crônicas, repito com Alvaro Lins (História Literária de Eça de Queiroz, 1939)  “refletem seu interesse pelos acontecimentos narrados pelos jornais e por todos os acontecimentos do mundo; ele é curioso com o desenrolar destes acontecimentos, porém sua visão não é míope ao ponto de ver coisas maiores nas coisas menores; por isto que suas crônicas não envelhecem e é por isto que envelhecem depressa as crônicas que se submetem aos prestígios da atualidade, cuja dinâmica massacra os escribas que são apegados exclusivamente à narração do cotidiano recente onde tudo é novo, novíssimo, tão novo, tão novíssimo que tem de ser dito às pressas, anunciado às carreiras, antes que a novidade vire papel de embrulho. Não há nada mais velho do que a novidade de ontem”.
            Fundamentalmente, o que tornou perene os escritos de Machado de Assis é o seu estilo inconfundível e que, aliás, foi definido por ele mesmo: “O cronista, na sociedade ocupa o lugar do colibri na esfera vegetal; salta, esvoaça, brinca, tremula, paira e espaneja-se sobre todos os caules suculentos, sobre todas as seivas vigorosas. Todo o mundo lhe pertence, até mesmo a política”.
            Todos nós, os escritores, temos ideias, ideal de beleza, concepção de vida; transmitimos estas nossas emoções aos leitores por intermédio de nossos escritos, porém, o fator diferencial é sempre o estilo que imprimimos à nossa escrita.
            O estilo não se adquire, é um dom pessoal, não se modifica com o tempo, o escritor poderá tornar o seu estilo mais belo, mais requintado, porém, nunca o recriará, ele será sempre o mesmo desde as primeiras páginas; segundo Eça de Queiroz “é pelo estilo que o ser se realiza, se fixa e permanece”; acode-me, para enfatizar o que afirmo, o escritor Álvaro Lins ( já citado) que diz: “É fácil verificar como desapareceram todos os escritores que não foram naturalmente portadores de estilo. As suas palavras deixaram de corresponder aos fatos, aos sentimentos, às ideias – a consequência fatal de todos os estilos artificiais”.
              O estilo de Eça de Queiroz continua muito perto das gerações que não o conheceram, tão moderno e tão dos nossos dias, até mesmo o seu “cacoete” no uso constante do ponto de exclamação que poderia causar algum mal estar pela desnecessidade do seu uso, tendo em vista que hoje em dia os leitores não se assustam diante de quase nada do que acontece no cotidiano das pessoas; leva-nos a entender a ingenuidade ou o entusiasmo do artista.
            Infelizmente não tenho suficiente conhecimento de crítica literária para analisar o estilo de Eça de Queiroz;  recorro-me, mais uma vez, ao escritor e crítico literário Pernambucano Álvaro Lins  que diz, entre outras coisas “Quando a palavra o desagrada ele busca uma palavra nova, não existe na língua portuguesa esta palavra? Eça procura-a na Francesa; fugia das palavras antipáticas e solenes para se socorrer de palavras modestas e discretas. Não queria exprimir em gritos!”.
            Todos os escritores, continua ensinando Lins, que não tiveram, naturalmente, seu estilo próprio, acabaram por desaparecer  e podem durar uma hora, uma vida, mas serão esquecidos.    


quarta-feira, 19 de dezembro de 2012

Discussão sobre crônicas (Parte II)


Alguns de meus personagens
 

Na ultima semana, dentre os muitos tópicos que foram discutidos sobre crônicas, lembro-me que chamei a atenção dos leitores quanto ao uso de personagens (fictícios ou não) para facilitar a empatia de quem está lendo o texto com o seu autor.

Costumo, com muita frequência, utilizar personagens fictícias nas minhas crônicas, algumas delas até de maneira repetitiva; acredito que esta é uma boa estratégia, tendo em vista a repercussão (cartas, e.mail’s) que a movimentação destas figuras nos textos costuma atingir os meus leitores.

Não faz muito tempo tive que esclarecer, ao final da narrativa de uma das costumeiras “artes” do Batistão, que o mesmo era um personagem de ficção, acrescentando: “O Batistão nunca existiu, o lugar onde ele mora, se é que ele mora em algum lugar, nem sei se existe, porém, tudo o que ele faz e diz é verdade”. Entenderam?

Como cultuo muito a literatura regionalista, utilizo em minhas crônicas e contos personagens “oriundas” do meio rural, algumas delas representam a justaposição de duas ou mais figuras que conheci no passado e que deixaram marcas indeléveis nas minhas reminiscências.

Muitas vezes, ao iniciar uma crônica, sinto que a personagem, a qual estou me referindo, toma conta da escrita e dirige, sem que eu perceba, toda a trama; com isto estou tentando dizer que ao escrever uma crônica que envolve apenas um personagem, o narrador precisa, até para “segurar” o leitor ao texto, descrevê-lo, as vezes algumas poucas caracterizações são suficientes, porém que estas sejam definidoras do seu biótipo, seu caráter e, sobretudo, sua onipresença na trama que será urdida. Cito alguns exemplos da minha lida:

MARIA JURUEMA, (Deixe-me contar enquanto me lembro, 2009) 

                        “Naquele domingo ela estava mais bonita do que o costume; o véu cobria-lhe a face, porém, não escondia os seus tentativos olhos negros, seus lábios, rebocados com muita discrição por um batom vermelho pálido, movimentava-se em silêncio, no compasso da reza; “adispois” aqueles cabelos no estilo pega-caboclo, cheios de cachos tentando encobrir-lhe a fronte, aqueles remelexos meio barulhentos que ela usava no braço, tudo isto transmitia, para ele, certa melúria”.

 

BATISTÃO (Alma do Sertanejo, 2011)·.

                      Batistão era bem moreno, magro, barba rala, sem bigode, porém com um par de costeletas enormes, dispostas à maneira de um triângulo de ápice superior, atingindo, na sua base alargada, até as imediações dos maxilares.  Sorriso de boca fechada, mãos calejadas e pés enfiados naquelas chinelas de borracha que são presas no vão dos dedos”.

 

AMOR DE VIUVA (Alma do Sertanejo, 2011).

                         “... Para ir à igreja na sua companhia, ela vestia aquelas roupas de chita estampadas, muito rodadas, fazendo “fru-fru” quando ela caminhava, o ombro, como convinha, era quase que descoberto, seu pescoço, modelarmente torneado, sustentava um rosto lindo e inocente; quando ria, o riso era leve, sem rumor, tal qual moça de família. E seu andar? Parecia o pisar de uma garça com a intenção de ser caçoísta com o companheiro: exagerava um pouco, porém sem excesso, o requebro do quadril.

                             Seu olhar? Ai meu Deus de misericórdia, quanta doçura! Deixava a moçada alvoroçada e com o coração em constante “bate-bate”; não lhe tiravam os olhos como se fossem jacarés chocando ovos, pareciam gaviões andando de um lado para o outro, comendo com os olhos aquela avezinha sem defesa; porém, ficavam somente na vontade porque aquela rolinha tinha dono”.

                           

                            Se o cronista, o contista ou mesmo o romancista quiser ser lido, precisa prender a atenção do leitor na primeira página do texto, às vezes na primeira sentença; uma boa descrição do personagem muitas vezes é o suficiente.

                            Gosto muito desta ultima descrição que transcrevi acima e acho que consegui agradar muitos dos meus leitores, pela constante troca de correspondência (internet); o maior elogio é a afirmação de um leitor que disse, textualmente: “deu-me vontade de conhecê-la pessoalmente e, sobretudo vê-la desfilar pelas ruas do lugarejo”.

                   Esta personagem que agradou meus leitores não era a que deu o título à crônica!

 

 

 

Discussão sobre CRÔNICAS – (Parte I)



        Semanalmente, atendendo convite do diretor do Jornal dos Lagos, meu primo Toninho Camilo, uso este cantinho que me tem sido reservado para conversar com meus conterrâneos de Alfenas e, por extensão de Gaspar Lopes, onde nasci; desafio que enfrento com muita satisfação.
                 De vez em quando sou questionado - escrevo crônicas? O que é crônica? Se os leitores tiverem paciência com este escriba vou, a partir deste texto, tentar esclarecer o que penso sobre o assunto; provavelmente vou ter que discuti-lo em alguns capítulos, tendo em vista que devo respeitar o espaço que me foi definido pelo editor do jornal, o amigo Valdir Cezário, zeloso da necessidade de dividir as colunas do jornal com uma grande gama de assuntos, muitos deles mais interessantes do que o meu ponto de vista sobre este tema.
              Aproveitarei parte de uma palestra que proferi, há alguns meses, no recinto da Academia Goiana de Letras em uma tarde-noite de “tertúlias” no nosso sodalício.
               O primeiro desafio a ser enfrentado ao se discutir o assunto “crônicas” será a necessidade de definir o que entendemos por crônica; segundo os dicionários é “História ou narração de um ou mais acontecimento em um determinado tempo” ou “narração dos principais acontecimentos”; tenho por mim que o dicionário diz o que todo mundo pensa de uma coisa quando usa determinado termo e, como a língua é dinâmica, provavelmente nenhuma destas duas definições consegue, hoje em dia, expressar o que todo mundo pensa sobre a crônica.
            Com a intenção de atender a diferentes pontos de vista, alguns críticos classificam a crônica em várias categorias, tais como a descritiva, narrativa, dissertativa, lírica, humorística, ficcional, narrativa histórica, texto sobre literatura, assunto científico, esporte, pequeno conto baseado no cotidiano, etc.
No meio deste emaranhado, parece que há algum consenso: o cronista deve estar atento a alguns pormenores a serem seguidos na elaboração do texto; alguns deles me proponho a discutir, sem o academicismo que muitas vezes afasta o interlocutor do escritor.
Normalmente a crônica é narrada na 1ª. ou na 3ª. pessoa (mais comumente), utilizam-se poucos ou às vezes nenhum personagem, sua linguagem é simples, situando-se entre a oral, a jornalística e a literária, facilitando com isto a empatia entre o leitor e o cronista.
Mario de Andrade, um dos precursores do modernismo no Brasil pela sua participação na semana de arte moderna de 1922, disse certa feita e, modestamente, concordo com ele, “Crônica é tudo o que o autor chama de crônica”.
Leiam comigo estes versos da poesia “Paisagem no. 1” que ele escreveu sobre São Paulo (que, segundo ele, algumas vezes imita a cidade de Londres) e depois me digam se isto não é uma crônica do cotidiano:

Minha Londres das neblinas finas!
Pleno verão. Os dez mil milhões de rosas paulistanas.
Há neve de perfumes no ar.
Faz frio, muito frio…
E a ironia das pernas das costureirinhas
parecidas com bailarinas…
O vento é como uma navalha
nas mãos dum espanhol. Arlequinal!…
Há duas horas queimou Sol.
Daqui a duas horas queima Sol.
                Peço ao crítico literário, Aleiton Fonseca, para ajudar-me a entender o que Mário de Andrade quis dizer com este poema (crônica?); a primeira aparente contradição: como pode fazer frio, muito frio, existir neblinas frias em “pleno verão”? O clima paulistano se define pela contradição (sol agora, depois neblina, daqui a duas horas volta o sol); as palavras neblina e frio e sol estão no campo de significação relativo a clima, o que permite definir São Paulo como um símile de Londres (cidade onde acontecem fenômenos semelhantes), aproximando o clima paulistano do clima europeu.
         No poema, são os dez milhões de rosas que constituem a diferença positiva em favor de São Paulo; as rosas dão harmonia ao perfil climático da cidade ao proporcionar “neves de perfumes no ar”.
            Leiam este poema de Manuel Bandeira (ele se baseou em uma noticia de jornal) e digam se não é uma crônica do cotidiano:
Estrela da vida inteira
            João Gostoso era carregador de feira-livre e morava no morro da Babilônia num barracão sem número
            Uma noite ele chegou ao bar Vinte de Novembro
            Bebeu
            Cantou
            Dançou
            Depois se atirou na Lagoa Rodrigo de Freitas e morreu afogado.
            Gostaria de perguntar-lhes se esta carta (resumo) que Mário de Andrade enviou para Câmara Cascudo em 1924 não estaria enquadrada dentro das definições de crônicas citadas acima, leiam-na comigo:
“... E agora um pedido. Tenho uma fome pelo norte, não imagina. Mande-me umas fotografias de sua terra. Há por ai obras de arte coloniais? Imagens de madeira, igrejas interessantes? Conhecem-se os seus autores? Há fotografias? Acredite: tudo isso me interessa mais que a vida. Não tenha medo de me mandar um retrato de tapera que seja. Ou de rio, ou de árvore comum. São as delicias de minha vida essas fotografias de pedaços mesmo corriqueiros do Brasil. Não por sentimentalismo. Mas sei surpreender o segredo das coisas comesinhas da minha terra. E minha terra é ainda o Brasil. Não sou bairrista”.
Se esta carta não for crônica, a resposta que foi dada a mesma, seguramente será!


terça-feira, 4 de dezembro de 2012

BATISTÃO E EÇA DE QUEIROZ



Eça de Queiroz
            
Semana passada, em uma das minhas investidas na biblioteca, encontrei um livro que há muito não folheava “A correspondência de Fradique Mendes, Eça de Queiroz, Editora Lello, Porto, 1933”; ao ler a carta que ele escreveu de Paris para seu amigo Ramalho Ortigão, deparei-me com uma passagem que me levou ao meu amigo Batistão.
            Sei que meus leitores não estão compreendendo esta ligação entre estes dois personagens com personalidades tão díspares, porém, peço-lhes paciência e leiam, inicialmente o resumo do que Eça diz ao seu amigo Ortigão e depois ouçam o que o Batistão me disse e vejam se não tenho razão em fazer a esdrúxula comparação.
            Eça, na companhia de dois outros amigos, tomava café em um daqueles famosos ambientes de Paris (café de La Paix) , quando se aproximou da mesa um argentino que era conhecido de um dos seus amigos, era o Sr. Mendibal.
            Com a maestria que lhe era peculiar, Eça consegue transpor para o papel o que o Sr. Mendibal falou a respeito da sua esposa (dele, Mendibal) e, principalmente os seus cuidados (dela) para com a mãe do Mendibal,  antes disto tudo ele explica a razão de aquele assunto entrar na roda de discussão na mesa.
            Com o fino humor que lhe caracterizava a escrita, ele diz “Mendibal, tendo posto ao lado sobre uma cadeira, com cuidados devotos, o ramo de cravos, desfiava as virtudes e os encantos de Madame”; “ Sentia-se ali uma d’essas admirações efervescentes, borbulhantes, que se não podem retrair, que transbordam por toda a parte, mesmo por sobre as mesas dos cafés””;  “onde quer que passasse, aquele homem iria deixando escorrer a sua adoração pela mulher, como um guarda-chuva encharcado vai fatalmente pingando água”; “O prazer que ele repuxava mais para fora o caroço da garganta, revelou que madame Mendibal era francesa”; e assim por diante até se dirigir, especialmente a Eça, para falar dos predicados de Madame, como nora. 
            “Sim, positivamente, não havia outra em Paris! Por exemplo, o carinho com que ela “cuidava da mamã (da mamã dele, Mendibal), senhora de grande idade, cheia de achaques! Pois era uma paciência, uma delicadeza, uma sujeição... De cair de joelhos! Então nos últimos dias a mamã andara tão rabujenta!... Madame Mendibal até emagrecera”.
            Até comecei, diz Eça, a simpatizar com o argentino, por compreendê-lo e não poderia haver nada mais sinceramente grotesco e tocante do que ouvi-lo, pois então continuemos a fazê-lo: “Neste domingo lhe pedi que se fosse a Versallhes, onde a mamã dela, madame Jouffroy, habitava por economia; pois senhores, todo o dia em Versalhes, a santa criatura estivera com cuidado na sogra, cheia de saudades da casa, n’uma ânsia de recolher! A maior parte da tarde e uma tarde tão linda gastara-a a reunir aquele esplêndido ramo de cravos amarelos para lhe trazer, a ele”.
            “É verdade! Veja o senhor! Este ramo de cravos! Até consola. Eu não sei se o senhor é casado. Perdoe a confiança. Mas se não é, sempre lhe direi, como digo a todo mundo: - Case com uma francesa, case com uma francesa!”.
            Na verdade o Batistão, até pela sua cultura machista arraigada na sua natureza, embora possa ser carinhoso (ao seu jeito) com a sua esposa Narandinha, não podemos dizer que ele tenha os rompantes de galanteios semelhantes aos do argentino de Eça de Queiroz; ele a ama a seu modo (desde que ela se adapte ao seu!).
            A prova disto passo a lhes contar: - Em uma tarde, à beira do curral, após soltarmos as últimas cabeças do gado, encostamos debaixo de um Ipê que sombreava um toco de angico, onde sentamos para tomar um pouco de água e, nem sei por que, começamos a falar sobre o relacionamento familiar, especificamente entre marido e mulher.
- Olha!  “Dotor”, mulher para viver junto com mais eu, debaixo do meu teto, deve ser igual à água do córrego que desce da serra, escorregando por cima das pedras, às vezes levando lambadas nos barrancos, porém não foge do rumo que foi determinado por Deus: chegar até o rio, com a cor branquinha e sossegada.
Num gosto de mulher novidadeira, mexeriqueira, destas que pegam a fuxicar com o que acontece na casa de fulana, sicrana e beltrana; devagar vai perdendo o rumo e desguarita para fora do leito, igual ribeirão que na curva apertada, perde o rumo e descamba pro varjão.
Quanto ao seu relacionamento com a sogra mereceria um capítulo à parte, porém, como o espaço é pequeno para relatar em detalhes o que sei, posso dizer que infelizmente o Batistão, depois de muitas discussões, que começaram após a mãe de Narandinha vir morar com o casal, apelou para a ignorância.
- Os finalmente ocorreram justamente no dia em que eu tava com “má intenção” com a Narandinha, conta ele, piscando um dos olhos com um sorriso de galhofa: o sol estava quase que escondendo por detrás do morro, era o lusque-fusque do dia, avistei a “marvada” na janela, enfeitada com uma flor de margarida amarela no cabelo que brilhava na briga com as faíscas do sol, que também clareava sua feição; Ai, Deus! Ao chegar à soleira da porta ela veio me receber com a alegria da mulher do canarinho da terra que encontra a companheiro.
Quando encostamos as duas caras um no outro, escuto a “cascavel” da minha sogra falar cheia de razão: - Está faltando mistura para fazer o jantar, homem de Deus, faça sua obrigação e vá buscar!
Não vou contar em detalhes o que aconteceu!
Foram embora as duas, este é o problema de morar com sogra, parece que viram “irmãos filipes”; uma não fica sem a outra; dois meses depois, voltaram as DUAS!